quinta-feira, 24 de outubro de 2019

Ecos Literários | Outra educação é possível

Nunca duvidei que eu podia e merecia muito mais. Batalhei. Revidei. Virei o jogo.
Luana Tolentino.

O educador Paulo Freire defendia que educar é impregnar de sentido o que fazemos a cada instante! Em Belo Horizonte, a professora Luana Tolentino foi buscar esse sentido mais profundo na sala de aula, em contato com diferentes grupos. Segundo a autora, para se alcançar uma educação que seja, de fato, participativa, inclusiva, antirracista, comprometida com respeito e justiça é necessário entender que a educação precisa fazer sentido para todos os envolvidos: os que aprendem e os que ensinam. 
Luana defende um aprendizado pelo encanto, pela curiosidade e pelo afeto; um aprendizado conduzido pelo diálogo, pelas trocas, pela escuta e pela ousadia. Afirma (e, coerente, vive isso no cotidiano) que trabalhar com educação é um ato político, a partir da compreensão de que se o indivíduo se vê com empatia, também é capaz de ver o outro, o diferente, com empatia. 
A partir da vivência como professora de História, em escolas da periferia de Belo Horizonte, Luana refletiu sobre sua prática em sala de aula, ousou e conseguiu mudanças a serem aplaudidas e imitadas.
Com propostas surpreendentes e parcerias inusitadas, ela percorre um caminho que exige ética, empenho, compromisso dos envolvidos com uma sociedade mais justa e igualitária, supressão de preconceitos e da neutralidade. 
Não é fácil, por certo, mas é um caminho que gratifica porque planta, ajuda a crescer, acolhe e aponta caminhos, ou melhor, deixa-os abertos à disposição de quem quiser percorrê-los.    

Os projetos, explicitados no livro "Outra educação é possível", têm títulos criativos e instigantes, como ‘Chimamanda é linda e feminista’, ‘Leonardo, Michelangelo e a arte do Vale do Jequitinhonha’, ‘Precisamos falar sobre feminicídio nas escolas’, ‘Marcela e Frida Khalo’, entre muitos outros.  São riquíssimos porque abrem as portas a uma efetiva inclusão e interdisciplinaridade, partindo de situações reais, lidando com seres quase invisíveis, mas que se transformam ao longo do processo, porque foram tratados com respeito e empatia. O livro emociona e devolve esperança àqueles que se sentem desanimados, nos dias de hoje.  
Sim, graças à ousadia, empenho, grandeza de alma e senso de justiça de Luana Tolentino é que podemos ter esperanças em uma nova educação. 

Livro: Outra educação é possível. Feminismo, antirracismo e inclusão em sala de aula.
Luana Tolentino. ISBN: 9788571607125
Belo Horizonte: Mazza Edições, 2018
Sobre a autora: Luana Tolentino, mineira de Belo Horizonte, é mestre em Educação pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) e professora de História da rede pública, na periferia de Belo Horizonte. 
 


Referências:
Tolentino, Luana. Outra educação é possível. Feminismo, antirracismo e inclusão em sala de aula. Belo Horizonte: Mazza Ed., 2018.
https://www.geledes.org.br/tag/luana-tolentino/

quinta-feira, 17 de outubro de 2019

Ecos Imateriais | Fábula do porco-espinho



Desde sempre, fábulas e histórias transmitem lições e ensinamentos úteis para o desenvolver valores como compaixão, respeito, empatia e solidariedade. Mais do nunca, em tempos sombrios e surreais de hipocrisia, sectarismo e preconceito é preciso buscar inspiração e consolo nessas narrativas. Pode parecer um contrassenso, hoje em dia, falar da fábula do porco espinho, mencionada pela primeira vez pelo filósofo alemão Arthur Schopenhauer (1788-1860), mas é justamente nesses momentos que ela parece fazer mais sentido.

Conta-se que na era glacial, muitos animais acabavam morrendo por causa do frio intenso. Para se proteger, alguns davam tratos à bola para descobrir formas de sobreviver. Os porcos-espinhos tentaram uma solução: eles se aproximaram, tentando aquecer-se e proteger-se contra o frio. Os espinhos, porém, pelos endurecidos por queratina, incomodavam e feriam os que estavam mais próximos e ofereciam calor para o grupo. A dor da proximidade foi muito forte; eles não a suportaram e acabaram se afastando. Morreram congelados. 
Dispostos a sobreviver, outro grupo dos mesmos animais concluiu que ou eles morreriam de frio ou teriam que aguentar os espinhos dos companheiros. Aproximaram-se com mais cuidado e, aos poucos, foram aprendendo a lidar e a conviver com as dores causadas pelo excesso de proximidade. Respeitavam o outro, mas guardavam certa distância, uma distância necessária e suficiente para aquecê-los e mantê-los vivos. Sobreviveram...

Moral da história: Não existe perfeição em nosso mundo. Seja nos ambientes familiares, profissionais ou sociais, não há relacionamento perfeito, porque não existem pessoas perfeitas. Desde que isso não fira a dignidade dos envolvidos, a melhor forma de se relacionar com o outro pressupõe aprender a respeitar, aceitar e a conviver com os defeitos do outro, sempre em prol de um bem maior: o bem-estar geral da comunidade. Porque, como diz uma conhecida frase, juntos, somos sempre mais fortes.   

quinta-feira, 10 de outubro de 2019

Ecos Literários | Humanidade em Guimarães Rosa


Com a desculpa de participar de uma oficina de tradução a ser realizada em breve com Alison Entrekin, a brava tradutora que está vertendo para o inglês a obra-prima de Guimarães Rosa (1908-1967), “Grande Sertão Veredas” (1956), andei às voltas com alguns textos, contos e sertões do autor, como se precisasse de desculpas para ler, reler, me emocionar e  admirar, pela enésima vez, o trabalho dele. É desnecessário tecer elogios à obra desse artesão das palavras e da língua, para sempre encantado na nossa Literatura.  
Queria apenas destacar o valor da criatividade no processo educacional, nas diferentes formas de ensinar e aprender literatura, por exemplo, para a formação integral dos indivíduos. Reforçar a necessidade e a seriedade de trabalhar a História e a Literatura em todas as suas nuances: fatos e personagens corriqueiras ou extraordinárias, acontecimentos cotidianos ou trágicos, situações verossímeis ou absurdas, com todas as possibilidades que a moderna educação nos permite. 
Assisti a alguns vídeos baseados no conto de Rosa: “Sorôco, sua mãe, sua filha”, do livro Primeiras Estórias. No conto, o escritor mostra um homem sofrido e cabisbaixo levando duas mulheres (sua mãe e sua filha única), à estação de trem. Para onde iriam? Pergunta o leitor. Assista e saberá.  


O primeiro vídeo é um trabalho escolar de alunos da Escola da Serra, em Belo Horizonte, feito em 2009. 
Publicado em 19 maio 2009
 O segundo, dirigido por Jom Monnazzi, é uma animação que esclarece detalhes para quem ainda não conhece o conto.
 
Vídeo 2: Animação dirigida por Jom Monnazzi 
Publicado em 20 de set de 2017.

O terceiro, mais longo, é uma adaptação para a televisão da mesma obra. 
 
 Vídeo 3: Adaptação do conto para a TV, 1975. 
Publicado por Kâmera Libre
 
Pode-se dizer que são complementares, por isso, deixo-os aqui para você, leitor e admirador da obra de Guimarães Rosa. Quanto aos dois primeiros, vale destacar que, além da boa ambientação e da boa interpretação dos alunos, imagino que o efeito pós-vídeo seja o mais importante. Digo isso, porque, a meu ver, professores, alunos, atores e todos que assistiram aos vídeos não vão se esquecer jamais:
- do conto "Soroco", tampouco de Guimarães Rosa...
- da emoção ou da representação da dor da perda...
- da simbologia do trem e dos sertões da alma e da vida...
- nem da humanidade dos que sentem e partilham nossas dores

Humanidade que se solidariza, tem empatia e ampara. 
Humanidade que acolhe, escuta e sofre junto...
Mas que não pode ficar amortecida ou se perder...jamais...
Sob risco de gerar intolerância, preconceito e ódio aos diferentes...
Sob risco de nos perdermos de nós mesmos.

Referências:
Guimarães Rosa. Sorôco, sua mãe, sua filha. Conto no livro Primeiras Histórias (1962).