sábado, 6 de junho de 2020

Ecos Humanos | Refugiados às avessas


Combate à peste bubônica. Wikimedia/Divulgação
Ela chegou de improviso e mexeu com o mundo todo maneira inusitada. A Covid-19 se instalou há alguns meses e trouxe mudanças irreversíveis no modo de vida das pessoas, com consequências diretas e indiretas. Não há como sair igual desse período. Aliás, nada será como era. Relações e vínculos familiares, por exemplo, mudaram. Podem ter ficado mais transparentes, verdadeiros e fortes, ou esgarçados; os indivíduos podem ter aprendido a reconhecer-se como de fato são; muitos mostraram seu pior lado e outros, sua melhor versão; negócios faliram, governos se revelaram amparando seu povo ou não e, graças à tecnologia, houve um sem número de lives sobre diversos temas - arte, música, política, literatura, tradução, yoga, saúde, meditações, astrologia etc. Quem tem acesso à internet deve ter aprendido algo novo nesse tempo.

O que nos cabe é viver o presente e quando tudo passar - porque vai passar - teremos uma carga única de experiências. Só não sabemos se estaremos aqui, nem tampouco o que nos aguarda o “depois”. O ser humano descobriu, finalmente, que não tem esse controle. Só sabemos que não será, nem poderá ser, como janeiro de 2020. Não havia nada de normal naquele período. Por outro lado, talvez tenhamos aprendido, de fato, o que significa ser (por falta de termo melhor) um refugiado às avessas, um refugiado em nossas casas, porque como diz minha querida amiga, a terapeuta Carolina Young, no fundo, somos “príncipes e princesas em nossos castelos”. Muitos não têm sequer a possibilidade de ficar em casa, seja porque prestam serviços essenciais, seja porque seu sustento vem do trabalho informal cotidiano, seja porque não têm como nem onde se abrigar já que moram nas ruas, embaixo de viadutos e marquises ou, quando têm onde se "abrigar", o termo “casa” seria um eufemismo cruel para o que têm.  

Dom Quixote, 1955. Picasso
Muitas vezes fingimos não ver, fechamos os olhos e ficamos encerrados nos nossos pequenos dramas para não nos fixarmos na dor dos que sofrem violência doméstica, preconceitos, agressões e abusos de todo tipo. Isso sem falar dos milhões de refugiados do mundo. Os tempos que se anunciam poderão trazer muita angústia, instabilidade, desemprego e fome. Resta saber o que estamos fazendo para nos ajudar e para ajudar os outros. Equilíbrio emocional ajuda o sistema imunológico a reagir às doenças e ações solidárias auxiliam mais aquele que dá do que o que recebe. Manifestações concretas de empatia, contra o racismo ou qualquer tipo de preconceito, também. Não podemos nos calar, nem nos omitir. Não basta pensar "que horror”. É preciso se levantar contra isso. 

Imagem: Nasa. Divulgação
Sempre trazendo ensinamentos simples, mas essenciais para uma vida plena, em uma de suas muitas lives desse período, Monja Cohen contou que, no Japão, há três regrinhas básicas contra crimes de racismo. Traduzidas seriam mais ou menos assim: Não faça, não permita que façam e não desculpe quem faz. Tudo, porém, sem violência. Isso é não se omitir, é posicionar-se e assumir seu papel (essencial) na busca por um mundo melhor. É estar desperto para o ser de luz que todos somos. Não há mais espera, o tempo é agora. Que caiam os véus da ilusão, da empáfia,do orgulho e do egoísmo. Que essa pandemia acenda, nos corações, a faísca da solidariedade real, unindo a espécie humana num só concerto de vozes e ações, caso contrário, a humanidade sucumbirá.

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