sexta-feira, 21 de abril de 2023

Ecos Urbanos | Repensando a cidade ideal

Dados do IBGE mostram que 85% da população brasileira já moram em cidades. Isso quer dizer que esses cidadãos buscam qualidade de vida, moradia digna, transporte público eficiente e condições de mobilidade, educação e saúde de qualidade, áreas verdes, espaços públicos seguros com iluminação, segurança e maior circulação de pessoas, cultura etc... Mas logo vem uma pergunta: se essa porcentagem é tão grande, as cidades deveriam atender aos desejos de seus habitantes e oferecer melhores serviços e oportunidades para todos, certo?

A resposta deveria ser óbvia, mas não é. Nossas cidades, em sua maioria, continuam se expandindo de forma não planejada, priorizando o transporte individual em detrimento do público e mantendo as conhecidas carências e desigualdades. Ou seja, a preocupação/ação do poder público (em especial o municipal, mas não só) parece estar distante do objetivo de criar cidades com oportunidades e melhor qualidade de vida para TODOS. Tudo fica na esfera das promessas, do sonho, de um futuro incerto e desejado, mas a prática é outra. Equipamentos e serviços essenciais de qualidade parecem sempre pensados apenas para uma pequena parcela da população. Ora, já passou muito da hora de repensar a cidade ideal.  

Mas, como seria uma cidade ideal? Penso a cidade como o palco de um imenso teatro, onde se desenrola o drama da vida. Cada ator deve desempenhar bem seu papel, aprender, conviver, trocar e desenvolver-se como ser humano. Se a estrutura física do teatro não oferece as condições mínimas para o ator se desenvolver e cumprir bem o que se espera dele, em que condições a peça da vida será encenada?  Nessas condições (ou na falta delas), poucos são os “atores” de fato conscientes de seu papel. A maioria parece apenas obedecer a um costume, a uma prática mecânica, há muito aprendida e repetida; não questiona, não cria, não inova mais, porque não existe cenário correto, nem direção, nem contrarregra, nem iluminação, nem qualquer equipamento que auxilie os atores a melhorarem seu desempenho. E eles continuam atuando, só que a maioria parece agir por inércia numa atitude passiva e sem reflexão, alheia ao seu poder interno de promover mudanças, sem a atitude decidida e firme de quem sabe como, por que e o que fazer. 

De um lado, seriedade, conhecimento e vontade política são elementos essenciais  para o poder público cumprir com seu dever de propor cidades, serviços e equipamentos melhores a todos.  De outro lado, cidadania e consciência são os ingredientes indispensáveis para o cidadão reivindicar uma cidade melhor para todos. Como? Com atitudes simples e cotidianas, já que qualquer ação nossa é política e tem força; porque dignidade é objeto de desejo (ainda que inconsciente) e direito pleno de todos. Então, ou você age em busca dessa qualidade de vida para todos ou deveria morar na Pasárgada: lá você vai ser amigo do rei e viver num mundo ilusório. Porém, como seres urbanos e humanos, a obrigação de todos nós, cada um em seu campo de atuação, é agir no sentido de melhorar as nossas cidades e suas estruturas, destacando benefícios e êxitos, mas também apontando falhas, carências e reivindicando ações.

B.Aires. Antes e depois do Plano de Mobilidade

Então, por que não começarmos pela nossa própria rua, nossa calçada, nosso bairro?  Como? Com educação e consideração pelo outro: não jogando lixo nas vias públicas; acondicionando o lixo doméstico, industrial e hospitalar de forma adequada (imagine o caos se ficarmos sem os profissionais e serviços de limpeza urbana); separando material reciclável; recolhendo de ruas e parques as fezes do seu animal de estimação; recolhendo folhas das árvores das calçadas para evitar entupimento de bueiros e enchentes; conservar equipamentos urbanos como lixeiras, postes de iluminação, painéis, placas, bancos etc; estacionando seu veículo de forma apropriada e lembrando que outros motoristas também precisam estacionar; dirigindo devagar, sobretudo perto das faixas de segurança, hospitais e escolas; dando prioridade aos pedestres e ciclistas; recusando e denunciando a “mágica” ilegal dos “gatos” de água, luz, TV ou internet... São desanimadoras as notícias que lemos sobre esses "gatos", ou o que vemos vemos no chão, sobretudo depois de grandes aglomerações. São cenas que deveriam envergonhar qualquer indivíduo que faça parte da dita humanidade. O fato é que aqui na vida real, com exceção das classes de renda alta e média alta, nossas cidades são maltratadas e a população, sobretudo da periferia, é quase sempre desrespeitada e humilhada. É urgente refletir, abrir os olhos e também o coração, e sair do seu quadrado. 

Pense nisso! No país, existem inúmeras organizações, como o portal BR Cidades e o Laboratório de Habitação e Assentamentos da USP, por exemplo, que são centros de excelência que discutem, trabalham e propõem ações para garantir a construção de cidades boas, justas, seguras e dignas para todos. Atualize-se e arregace as mangas. Por uma cidade inclusiva, segura, agradável e melhor para todos!

Referências

https://www.brcidades.org/

https://labhab.fau.usp.br/

https://www.wribrasil.org.br/

https://www.cidadessustentaveis.org.br/inicial/home  

7 comentários:

  1. Excelente texto, Anita!
    Quando você fala do espaço citadino, a gente chega a ver o ideal possível.
    A arrumação, a simplicidade e a complexidade.
    A nossa civilização tem mesmo que se esforçar para melhorar.
    Grande abraço

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    1. Oi. Valquíria....e esse é um esforço diário para o futuro. Não dá para desanimar....obrigada por comentar..Lindo dia para vc! Abs

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  2. Jcamposr30@gmail.co
    👏👏👏

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  3. Anita!
    Você incita a nos recompormos, a percebermos que o nosso quadrado inclui como nos tratamos de nós mesmos, como tratamos o nosso lixo, do nosso meio de transporte… como cuidamos das nossas atitudes…respeitando ou não por onde passamos, olhamos… calçadas , da nossa equipe de trabalho …
    Este texto nos chama a nos aprofundar dentro de nós … pois só assim veremos que somos parte da Natureza , e assim buscarmos uma convivência mais equilibrada com a Natureza…
    Obrigada

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    1. E enquanto isso não ocorre -- a percepção de que fazemos parte da natureza -- o ser humano vai destruindo a natureza e destruindo a si mesmo. É urgente tomar consciência! Obrigada por comentar. Abraços

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  4. Anita, seus textos são maravilhosos! Despertam em nós muitas reflexões! Sofremos as consequências de nossas omissões. Precisamos exercer nossa cidadania, nossas possibilidades e deveres dentro de nossa comunidade!

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    1. Obrigada, Teresa. É como um efeito dominó, não é? Se todos agirmos a partir do nosso local, as ações vão se espalhando e tomando dimensões maiores. Equanto isso não ocorre, continuamos falando, falando e fazendo a nossa parte.... Uma hora a ficha cai ... Grande abraço

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