Fenômeno
linguístico inevitável, nem sempre bem-visto, o estrangeirismo (uso de palavras
e expressões de outros idiomas incorporados no português) pode ser visto como
um processo natural, resultado do avanço tecnológico, do intercâmbio cultural
e/ou socioeconômico, da moda etc. São palavras ou expressões que podem ser inseridas na nossa linguagem cotidiana como escritas no idioma original ou aportuguesadas. Se excessivo, porém, o uso pode tornar-se um
vício de linguagem além de inibir e desencorajar quem não entende o que está sendo dito, o que
dificulta a própria comunicação. No caso do inglês, por exemplo, há algum
tempo, apareceu nas redes sociais uma listinha com alguns dos termos em inglês
mais usados aqui e, ao lado, a respectiva tradução em português. Era algo
assim: não é budget, é orçamento; não é job, é trabalho; não é meeting,
é reunião; e assim por diante.
Vamos às ponderações. Antes de qualquer coisa,
ninguém é obrigado a entender termos de outra língua e, depois, muitas vezes
esses termos sequer são pronunciados de forma correta. Autores de Samba do Approach, Zeca Baleiro e Zeca Pagodinho já ridicularizaram, no samba, o uso excessivo de
estrangeirismos por aqui, não? Agora, será que esse excesso ocorre também em outras
línguas? Não sei responder, só sei que, na Itália, por convenção quase todos os
filmes, passados no cinema, são dublados até hoje e muitos nomes de compositores clássicos eram
transcritos para a estrutura linguística do italiano. Assim Tchaikovsky era escrito Ciaicovsky.
Confesso que estranhei quando estive lá (e ainda estranho).
Ocorre que,
se o português brasileiro tem termos equivalentes, por que usar os de outra língua? Isso
pode evidenciar: jargão novo e específico de determinado campo de
trabalho; assimilação cultural; ou que tal uso é considerado chique (?). Por outro lado, outros empréstimos
linguísticos foram incorporados ao nosso idioma (balé, futebol, sutiã, buquê,
mezanino, alegro, andante etc), e outros ainda são grafados como no
original – pendrive, software, hardware e-mail,
mouse etc. Serão incorporados de vez? Só o tempo dirá. Afinal, a língua é
viva, muda e se renova com o tempo. Alguns desses termos podem até ser substituídos por outros, ou não. De qualquer
forma, continuo preferindo a velha tigela, cumbuca ou terrina a bowl; desempenhar, realizar ou executar a contento uma tarefa a performar; conectar, fazer referência a, ligar a linkar... Ah... e nem me fale de influencers, termo que virou
“profissão”. Sem comentários...
Lembro que no
Congresso Nacional, em 2001, tramitou um projeto de lei para barrar o uso abusivo de
estrangeirismos no caso de haver equivalentes no português. Alguns alegaram que o uso era sinal de submissão a
culturas dominantes e outros, que era sinal
dos tempos e da globalização. O projeto não foi
aprovado.
O fato é que é preciso valorizar, apreciar e usar bem a nossa riquíssima
língua, desde cedo, já que somos mais de 200 milhões de falantes nativos do português
brasileiro, o que a torna uma das línguas mais faladas no mundo. Aliás, variações, formas diferentes de falar, diminutivos, elisão de letra e certos desvios
da norma padrão são características comuns em qualquer idioma e não erros, mas
só aqui isso parece tão criticado e menosprezado. Pergunto-me se não existirá aí um certo
preconceito embutido... E, para citar um estudioso do campo das Letras, o autor,
tradutor e professor da Universidade Federal do Paraná, Caetano W. Galindo,
destaca e explica essas sutilezas em seu ótimo livro Latim em Pó.
Mas
algo que também me incomoda (e muito) é o proposital uso enganoso da língua. Há
dias, vi um comercial de automóveis que dizia: "Compre agora por APENAS
200 mil reais. Oi? Como assim apenas?
Para mim, isso revela má fé deliberada, falta de compromisso com a verdade e de criatividade. Nesse caso, nem é preciso citar a teoria de análise do discurso, certo?
Enfim, não precisamos do mau uso nem do uso exagerado de
estrangeirismos na nossa língua. Dependendo da ocasião, o uso desses termos no dia a dia pode parecer arrogância. Elegante é respeitar o outro e, se necessário, saber muito bem quando usá-los. Mas bom mesmo é valorizar a língua falada por Camões, Fernando Pessoa, Mia Couto, José
Saramago, Clarice Lispector, Machado de Assis, Graciliano Ramos, Guimarães
Rosa, Conceição Evaristo, Lygia Fagundes Teles, Chico Buarque, Raduan Nassar,
Milton Hatoum, Itamar Vieira Junior, Socorro Acioli, Djamila Ribeiro e tantos
outros autores brilhantes! Aliás, a literatura nos ajuda a desenvolver a nossa
língua e evitar estrangeirismos! Bom senso é a palavra-chave. Sempre.
Referências
https://www.trf3.jus.br/emag/emagconecta/conexaoemag-lingua-portuguesa/estrangeirismos
https://brasilescola.uol.com.br/redacao/estrangeirismos.htm
https://www.portugues.com.br/gramatica/tudo-que-voce-precisa-saber-sobre-estrangeirismo.html
https://www.normaculta.com.br/estrangeirismos/
http://www.portaldalinguaportuguesa.org/index.php?action=loanwords&act=list
Concordo inteiramente com você. É de uma arrogância absurda este estrangeirismo .Temos um idioma tão rico!
ResponderExcluirParabéns pelo texto.
Ione
Tema apaixonante.
ResponderExcluirO que me assusta é que parte dos grupos sociais mais ricos está matriculando seus filhos em escolas bilíngues. No futuro esses jovens falarão o português com o sotaque do Mangabeira Unger e olharão com desprezo para o resto da população. Zé Marcelino
ResponderExcluir:(
ExcluirParabéns pelo texto Anita, concordo totalmente com você exercito isso sempre, inclusive sempre pergunto, quando ouço estrangeirismo novos, qual a sua versão no nosso bom português.
ResponderExcluirMuito bom Anitinha! Não entendo essa mania de usar o inglês nas lojas de shopping. Aqui, é Brasil.Pode ser a submissão ao país todo poderoso.Nossa língua é tão rica.Bebel
ResponderExcluirMuito bom. Além de influencers, não há nada que me deixe tão irritada como 10%off e sale definitivamente adotado por qualquer lojinha brasileira.
ResponderExcluirExato, sem noção.....
ExcluirConcordo plenamente com você! Nossa língua é extremamente rica para se abrir ao uso de termos estrangeiros e incorporá-los desnecessariamente. Penso que o uso de mestrangeirismos denotam nosso complexo de vira-latas que nos turva o discernimento .
ResponderExcluirLilian Cinde, obrigada , meu bem. Tal complexo é deprimente, para dizer o mínimo. Obrigada por estar sempre por aqui. Abraços
ExcluirMuito bom!
ResponderExcluirPrecisamos ler mais para conhecer e usar, de forma adequada, nossa língua portuguesa.
ResponderExcluirNão vejo o porquê do uso de termos estrangeiros, que muitas vezes se fala sem entender. Parabéns Anita pela abordagem.
Muito bom, Anita! O tal do sale é de doer! Saudades de nossas prosas! Bjs
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