Continuação da Parte 1.
Nesses sete meses de 2020, de março a setembro, a pandemia da Covid 19 veio para nos mostrar que não somos tão poderosos quanto pensávamos nem temos controle de tudo. Apesar do choque, das dúvidas e das perdas, é preciso estar aberto para redescobrir, revisitar conceitos e situações, porque o olhar acostumado, não enxerga mais o “diferente”. Só vê o que teima em considerar “normal”.
O momento exige respostas a algumas questões
fundamentais: Quem são os privilegiados que podem ficar em casa, encher seus carrinhos com alimentos e assistir
às discussões virtuais? Como o Estado, a sociedade e as escolas se mobilizam para
ajudar os que não têm acesso à alimentação, à internet, à uma moradia digna ou os que sofrem
violência doméstica? Como corrigir esse gigantesco fosso de desigualdade,
sempre existente, mas agora escancarado pela pandemia? Como a questão da pandemia poderia ter sido abordada
pelos governos, desde o início, priorizando o ser humano, sobretudo os mais
vulneráveis? Como negar o que vemos agora e a necessidade imperiosa de mudança?
Mobilizar-se para alcançar tais objetivos, democratizando serviços de qualidade, vai muito além da solidariedade surgida nesses tempos. O distanciamento social (ainda que negligenciado por tantos que não acreditam na doença ou recusado por aqueles que nunca pensam no outro) e a quarentena, ainda que falha em alguns aspectos, fizeram muitos perceberem que não precisavam de tanto - tantos bens, tantos objetos e sapatos, tantas roupas e bolsas. Começaram a doar. Mas solidariedade não pode surgir apenas nas grandes tragédias. Deve ser constante e parte do cotidiano de cada um. Tem a ver com o conceito de empatia (identificar-se com o sentimento do outro), e é o mínimo para podermos dormir à noite, certos de que cumprimos nosso dever como sociedade humana.
Além disso, é preciso garantir a sanidade mental, o
equilíbrio emocional, o poder de raciocinar, resistir e não se deixar abater.
Sou daqueles que não acreditam que as pessoas sairão transformadas dessa
pandemia. Quem já tinha consciência da necessidade de uma ação empática, e de
seu papel ativo na sociedade na busca do bem comum, continuará a agir como tal,
mas aqueles ególatras, perdidos em seus
próprios interesses, continuarão flanando em torno de seu mundo
miúdo e fechado. É só olhar a história da humanidade. Ela se repete. Hoje, como antes, essa sociedade pragmática e
individualista só quer saber da vacina para voltar ao seu chamado “normal”.
De qualquer forma, apesar dos perigos, se estamos vivos, se temos trabalho, teto e alimento, somos sobreviventes e devemos nos ajudar. Temos um papel nisso tudo que inclui agir no presente para o futuro. Agradeça e reinvente-se. O velho normal acabou. Uma nova era já se inicia e vem derrubando velhos conceitos. O que nos resta é estabelecer novas prioridades, novas formas de agir em relação a nós mesmos, aos mais próximos, aos outros e ao meio ambiente. Uma forma mais feminina, ecológica, coletiva, inclusiva e solidária. A música No novo tempo, de Ivan Lins pode nos dar esse chama de lucidez para criarmos uma sociedade mais humana, justa e compassiva.
Termino lembrando a filosofia Ubuntu, que se apoia no profundo conceito que diz Eu sou, porque todos somos, e uma frase de um arquiteto inovador e visionário, criador da cúpula geodésica e que trabalhava para criar um mundo melhor para toda a humanidade. Li e guardei a frase, não a fonte. Um arquiteto que me inspirou durante a faculdade de arquitetura e que continua a me inspirar, Buckminster Fuller (1895-1983): ”Não se pode mudar as coisas lutando contra a realidade atual. Para mudar algo é preciso construir um modelo novo que tornará o atual obsoleto.”
O atual está se desfazendo. É tempo de criar o novo.
Referências
https://www.worldometers.info/coronavirus/?
https://www.bfi.org/
https://anitadimarco.blogspot.com/2018/10/ecos-imateriais-ubuntu.html
Texto bonito!Real! Temos que mudar pra melhor,enxergarmos o outro como Jesus disse:Amei vos uns aos outros como eu vos amei.Bebel
ResponderExcluirOi, querida! Pois é... e até hoje não aprendemos quase nada... Ainda temos um longo caminho pela frente... bjs
ExcluirÉ tempo de criar o novo, partindo do conhecimento existente e revestindo-nos de uma sensibilidade , humildade e empatia que nossas crenças e valores sustentam . Helena
ResponderExcluirEste comentário foi removido por um administrador do blog.
ResponderExcluirAnita, bom ler um texto lúcido e sensível, num momento em que a bestialidade parece dominar o mundo. O nosso normal era odioso e o novo anormal aparece como este espaço de tensão entre o velho normal e o futuro incerto, porque não sei se aprenderemos as lições que a "anormalidade" poderia nos ensinar.
ResponderExcluirAnne
OI, Anne. Verdade, é como se fôssemos um grito parado no ar.... Acho que um dia as mudanças vão acontecer, só não sei quando.... Obrigada, meu bem, por estar aqui. Uma honra,,, beijos
ExcluirSim. A situação é mais complicada do que pensamos.
ResponderExcluirAté ser solidário, nestes dias, é perigoso.
Só a mudança de muitas realidades pode trazer alguma esperança.