sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025

Ecos Linguísticos | Italianidade


Toda língua tem centenas e centenas de termos que constituem seu léxico e, evidentemente, sendo línguas vivas, elas mudam: palavras são acrescentadas, algumas ficam esquecidas, outras caem em desuso e assim por diante. Outros termos, no entanto, são sempre agradáveis aos ouvidos na forma de falar, na escrita ou pelo próprio significado, estejam ou não em uso. Despertam algo no ouvinte - riso, alegria, estranheza. Enfim, intrigam, inspiram, comovem e divertem.

No meu caso, a língua italiana, em particular, faz bem aos meus ouvidos, ao meu coração e alguns termos até me fazem sorrir e querer repeti-los de boca cheia: “comunque” (de qualquer forma), secondo me (a meu ver), cocodrillo (crocodilo), o tal addirittura (realmente, de fato), o “dai, forza” (vamos lá, força), o “sono distrutto” (estou cansadíssimo, exausto), o "sbrigatti” (se apresse), o tão falado "ormai" (nesse momento, nesse ponto), o peculiar "bóh" (não sei, não entendo), "allora" (então, portanto), o assustador "spiffero" (vento encanado), "chiacchera" (tagarelice), "che puzza" (que fedor) e outros tantos. Não sei bem o porquê, mas gosto de como eles soam, gosto de pronunciá-los e sempre me pego sorrindo ao ouvi-los...E claro, sempre me pego falando com as mãos.

Bom, talvez seja porque a língua italiana sempre esteve por perto. Meus avós paternos eram italianos, da Calábria, o que levou muitos amigos a apelidarem meu pai e eu (carinhosamente, quero crer!) de “calabreses”... Diziam que éramos bravos, exaltados! Eu, hein? Ainda bem que a gente muda um pouco, certo?

Dante Alighieri
Bom, o fato é que, desde cedo, convivi com meus avós falando mezzo portoguese, mezzo italiano e, é claro, no mais das vezes, no dialeto deles. Com isso, acabei aprendendo muitos desses termos diferentes do italiano padrão. Quando fiz o curso regular de língua italiana, mais de uma vez a professora me chamou a atenção dizendo que eu não falava a língua culta, mas expressões dialetales. Aos poucos, fui aprendendo a me expressar – falar e escrever – “corretamente” - na língua de Dante. Ora, mas não se pode esquecer que a língua viva, a que perdura, é a dos falantes, não? 


Bem, terminada a faculdade, fui fazer uma pós-graduação em patrimônio histórico, em Roma. Era um curso internacional ligado à Unesco, portanto, era todo em inglês, embora no dia a dia, fora da sala de aula, falássemos em italiano, ao menos a maioria de nós. Sempre atenta às línguas, eu notava diferença entre os falantes, não só estrangeiros, com seus diversos sotaques, mas também entre os próprios italianos. Em Florença, por exemplo, o "C" era aspirado), diferentemente de Roma, Veneza ou Nápoles. Mas no final, todos se entendiam. É como aqui no Brasil: todos falam português, mas cada região tem formas próprias e termos característicos e próprios. E, convenhamos, um país de dimensões continentais como o nosso, onde todos se entendem e falam a mesma língua é um presente e quase uma exceção!

Fato é que, depois de quase um ano lá, falando, ouvindo e lendo italiano diariamente, até houve uma discussão acalorada entre os participantes do curso sobre algumas escolhas em certo projeto de restauro. Foi muito bom me perceber discutindo em outra língua já que meu italiano estava tinindo; tanto é que, na volta ao Brasil, quando eu já trabalhava na revista Projeto, a primeira revista de arquitetura do país, fui a um congresso entrevistar um arquiteto uruguaio. A intenção era entrevistá-lo em espanhol, evidentemente. Quando dei por mim, lá pelas tantas, ele e eu estávamos falando em italiano. Começamos a rir e continuamos nesse idioma. Ele morava no Uruguai havia alguns anos, mas era nascido na Itália e, ao perceber que eu mudara, sem perceber, do espanhol para o italiano, ele apenas me acompanhou. Gentilíssimo, não?

No frigir dos ovos, eu, que falava espanhol (ainda que pouco), a partir daquele dia, não consegui mais falar a língua de Cervantes sem mudar, no meio da conversa, para o italiano....É como se a língua me chamasse e surgisse naturalmente... Amo! Por isso, sempre que posso, leio, ouço música e vejo filmes italianos. Claro e também fiz várias traduções do e para o italiano, para arquitetos, editoras e para o ICE - Italian Trade Agency. A propósito, há alguns dias, assisti a um belíssimo filme, na Netflix. Foi meio sem querer, estava zapeando e vi o título em italiano: Il treno dei bambini... Um filme lindo, triste, delicado e baseado em fatos reais. Recomendo!

Allora, mi dispiace, carissimi lettori, pero devo andare via. Grazie e alla prossima!

Referências

https://www.ice-sanpaolo.com.br/index2.php 

https://www.berlitz.com/es-us/blog/italiano

https://www.berlitz.com/es-us/blog/palabras-hermosas-en-italiano

14 comentários:

  1. Amo molto l'italiano, perché sono figlia di un italiano. Mi tocca il cuore ❤️

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  2. Che Bello, Anita! Eu senti a sua empolgação daqui! E compartilho dessa paixão pelas línguas! Um fim de semana de alegria e paz pra vc! (Felipe Bizarria)

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    1. Grazie, carino... Anche tu sei un amante delle lingue. Abbraccio

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  3. Pure io sono ormai diventato italiano.

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  4. Estudei 1 ano de italiano. Parlo pouquíssimo mas da para entender algumas frases.Grazie
    Anitinha! Bebel

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  5. Eu finalmente criei vergonha na cara e estou estudando italiano, capisco tutto, però non parlo (o iscrivo) niente! O que acho mais curioso é que, sempre que estou praticando oralidade, as mãos ficam inquietas - como se precisassem ser envolvidas para o texto sair correto!

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    1. Hahahhahahha, exatamente. Minha irmã sempre disse que não consegue falar se as mais estiverem presas.... Faz parte, né? Beijos

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  6. Adoro o secondo me. Sbrigatti é o máximo. Sugiro a série Amiga Genial. Apesar de boa parte ser em napolitano, a sonoridade do italiano nos acompanha durante dias.

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  7. Que delícia de texto … compartilhei com amigos calabreses… Viva a Vida com gentilezas de contar !!!

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  8. Que demais! Adorei e me diverti 😍

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  9. Também sou de origem italiana e também gosto da língua...

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