Idiossincrasia: forma extravagante ou incomum, excêntrica,
esquisita de um indivíduo se portar na sociedade; modo de agir fora dos padrões
normais e esperados, ou seja, conduta comportamental atípica.
Bom, é de conhecimento público que,
em geral, milionários, excêntricos e artistas – das artes plásticas (pintura e escultura), do
ramo musical (músicos, compositores e intérpretes) ou das artes cênicas (teatro,
cinema ou TV) – podem ser temperamentais, estranhos, esnobes e manter ativas suas muitas idiossincrasias. Nós, meros mortais, até podemos ter algumas manias, é claro,
mas quase sempre bem menos estranhas. Enfim...
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Divulgação |
Durante um dos
muitos workshops de tradução, conduzidos pela tradutora literária Alison Entrekin,
estávamos trabalhando em um poema da premiada australiana Sarah Holland-Batt e nos deparamos
com o termo em inglês vantablack. Alguns de nós já tinham lido algo a
respeito, mas a maioria desconhecia o termo. Bem, vantablack é um tipo de tinta, ou melhor, um revestimento inicialmente (agora também em spray), muito, muito preto, feito de nanotubos de carbono.
Inventado em 2014 por pesquisadores
britânicos e produzido pela empresa inglesa Surrey NanoSystems, o produto foi
considerado como o preto mais preto já produzido em laboratório, capaz de absorver
99,96% da luz visível ao olho humano. Ou seja, é considerado o material mais escuro do mundo. Seria como se você olhasse
para um buraco sem fundo, completamente escuro. Provavelmente, você já deve ter visto imagens retratando algo que parece
uma sombra ou um buraco no chão ou na parede...
Pelo seu alto
custo, a princípio, o produto deveria ser usado apenas para pesquisas acadêmicas, mas bem
que poderia ser usado por artistas, escultores, performers, arquitetos, não? Poderia, mas
não foi bem isso que ocorreu. Um desses seres que colecionam idiossincrasias,
o milionário indo-britânico Anish Kapoor (1954), resolveu comprar os direitos de
uso da substância em 2016. Ou seja, se alguém quisesse usar aquele revestimento
teria que pagar, e muito, ao detentor desses direitos.
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Cloud Gate (Shutterstock) |
Kapoor é um artista que tem obras pelo mundo todo,
como a Cloud Gate, em Chicago, feita em 2004, escultura
inoxidável de aço de 110 toneladas, e a Torre ArcelorMittal Orbit, feita em Londres, por ocasião dos jogos olímpicos de 2012 (foto à direita). Definitivamente, quando visitei a cidade, não foi a minha obra de arte
favorita, embora não passasse despercebida no lado leste de Londres, com seus 115m de altura de metal vermelho.
Ocorre que a compra dos
direitos de uso do vantablack incomodou a comunidade artística,
em especial, o também britânico Stuart Semple (1980). Ele começou a pesquisar e
criar o rosa mais rosa possível, o azul mais azul e assim por diante, vendendo essas
paletas de cores a preços módicos a quem quer que seja, exceto Anish Kapoor. Semple criou ainda um preto bem preto, aprimorando
sua fórmula várias vezes, até deixá-lo bem perto do vantablack
existente.
Mas a história não
parou por aí. A partir da primeira jogada de Kapoor, várias reportagens discutiram
essa atitude do artista com réplicas e tréplicas. Semple, ao menos, foi mais criativo.
Ora, eu me pergunto.
Isso pode acontecer? Legalmente talvez possa, mas moralmente é muito feio, não?
Idiossincrasias à parte, na arte, na vida, nos museus e palcos da vida há espaço
para todos (ou deveria haver). E, assim, o
próprio poema que estávamos traduzindo ganhou novas nuances. Será que
poderíamos usar a tradução ou ela também estará proibida? Vida que segue.
Referências
https://www.chicago.gov/city/en/depts/dca/supp_info/chicago_s_publicartcloudgateinmillenniumpark.html
https://www.format.com/magazine/features/art/anish-kapoor-stuart-semple-vantablack-blackest-black
https://www.tudocelular.com/tech/noticias/n90821/vantablack-o-material-mais-escuro-do-mundo.html
https://tmjuntos.com.br/comunicacao/stuart-semple-x-anish-kapoor-a-maior-treta-do-mundo-da-arte-que-voce-pode-comprar/
http://stuartsemple.com/
| https://www.instagram.com/stuartgt/
https://pt.wikipedia.org/wiki/Anish_Kapoor
https://g1.globo.com/Noticias/Mundo/0,,MUL1552949-5602,00-OLIMPIADAS+DE+LONDRES+TERAO+TORRE+ASSINADA+POR+ANISH+KAPOOR.html
Oi, Anita. Como sempre trazendo um assunto instigante. Penso, contudo, que o Kappor está mais para um mau caráter do que para um idiossincrático. Tema maravilhoso para se debater. Zé Marcelino . PS. Mas pode ser uma idiossincrasia minha.
ResponderExcluirConcordo, Zé.. totalmente, mas me abstive de comentar ... Achei muito individualista e egoísta a atitude dele, como a de tantos mais em outros temas. Triste fim da humanidade.. beijão
ExcluirMuito interessante o assunto é eu não conhecia o termo e nem esse egoísmo de Kappor.A vida as vezes nos apresenta cada uma.Bebel
ResponderExcluirInteressante, Anita! Realmente, esse tipo de produto, invenção ou semelhante deveria ser para todos mas tenho visto que, frequentemente, esses mega bilhonários (mega ou maga?) não sabem compartilhar nada. Pelo contrário... Só enxergam--e só pensam em-- a própria imagem de Narciso. =(
ResponderExcluirPois é, também acho...Narciso é quem domina.. muito bem lembrado. Abração
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