segunda-feira, 27 de julho de 2020

Ecos Musicais | A música no cotidiano

No final da década de 1980, logo que me mudei para Varginha, no Sul de Minas, uma das coisas que mais me encantou na cidade foi seu Conservatório Estadual de Música. Isso porque, desde criança, em São Paulo, a música sempre esteve presente no meu dia a dia: dos arranjos de gaita do meu pai, cantigas de roda da escola e  cantos ensinados pela minha mãe às canções que ela mesma cantava e cantávamos junto, às aulas de dança, ginástica rítmica e violão. Todo dia era dia de música, cantoria e dança em casa, e nas mais variadas formas. A música fazia parte natural do nosso cotidiano. No entanto, o Conservatório Municipal de São Paulo era distante, muito procurado e tinha poucas vagas. Não consegui estudar lá. Então, como os pais costumam fazer,  tentei oferecer aos meus filhos as oportunidades que não tive e que considerava essenciais para uma boa formação. O contato com a música em um conservatório era uma delas. 

Vale lembrar que desde que fiquei grávida, lá em São Paulo ainda, os bebês já recebiam vibrações musicais. No nosso pequeno apartamento, em Pinheiros, o som rolava solto e o paizão, fissurado na boa música, tinha coleções de LPs, os famosos bolachões, escolhidos a dedo na Praça Dom José Gaspar, em São Paulo. Tínhamos de tudo: de música internacional ao rock, de Beatles à country music, da MPB aos latino-americanos, dos clássicos e música instrumental às alegres composições do Nordeste. De tudo, um pouco, mas de muita qualidade. As crianças participavam e curtiam nossa cantoria. Hoje, a caçula herdou o toca-discos e um grande número daqueles LPs.

 Apresentação de flauta doce. foto: Anita Di Marco
Aqui em Varginha, o Conservatório Estadual Maestro Marciliano Braga (CEMVA) era joia rara da cidade. É, até hoje! Era acessível, com ótimos professores, atenciosos e acolhedores. Consegui a tão esperada vaga e as crianças passaram a ter aulas de musicalização, flauta doce, piano, violão, bateria, criatividade, dança, teatro, história da música, coral etc. Como pais atentos, participávamos de tudo: eu, sobretudo, levava, buscava,  incentivava, assistia às apresentações, aplaudia e chorava. Como chorava!!!! Além disso, fui membro do Colegiado, mais de uma vez. Diga-se de passagem, adorava tudo isso!   

O tempo foi passando. Os filhos estudaram, tocaram e cantaram e aproveitaram aquele tempo, mas decidiram seguir outros rumos profissionais. A música, no entanto, já estava neles (desde a gestação). já sabiam apreciar os sons, a noção de conjunto, o ritmo e as diversas vozes, diferentes e sempre necessárias para compor a harmonia, em qualquer área da vida. Até hoje, lembro com carinho dos primeiros professores que os ajudaram nessa caminhada: em especial, os "tios" Flávio, Marly e Alex Tiso e Leonilda, que acolheram minhas crianças em seus corações, despertando, de vez, a alma deles para a música. Obrigada!   

segunda-feira, 20 de julho de 2020

Ecos Culturais | A História e as mesmas histórias


Sou desconfiada de nascença, aliás, acho que é um hábito bastante salutar. Diante de qualquer fato, notícia ou leitura, é sempre bom colocar o bom senso e o olhar crítico em ação e, em tempos de enxurradas de notícias falsas, isso é mais importante do que nunca. O fato é que quando se estuda História, percebe-se que, ao longo do tempo, a humanidade pouco mudou: rebeliões, guerras, interesses escusos, traições, vinganças, lutas pelo poder, golpes, descaso, calúnias, pandemias... 

É verdade! Houve muito progresso científico. Aí estão a tecnologia, a internet, os celulares, as pesquisas, a medicina, as viagens espaciais, os meios de transporte.... Porém, do ponto de vista moral, os fatos continuam se repetindo, talvez com métodos mais sutis ou nomes diferentes. Mas, de qualquer modo, tudo parece incrivelmente atual... Aliás, o italiano Giuseppe Tomasi di Lampedusa (1896-1957), autor de Il Gattopardo (O Leopardo), já dizia que para tudo continuar igual, alguma coisa deveria mudar. Seu livro narra a decadência dos nobres da Sicília, Sul da Itália, e a ascensão de outra classe ávida por poder. Será que não é o que vemos todos os dias? Pois, afinal, a história oficial, aquela que conhecemos nos bancos escolares, é a versão contada pelos vencedores, porque a versão dos vencidos não é conhecida, quando não é apagada.  
Logo, fontes confiáveis são cruciais para entender a História e uma boa ajuda é o blog editado pela historiadora Marta Iansen, História & outras histórias, um manancial de interessantes dados históricos. É um blog informativo, divertido e perspicaz. Se você se interessa pela humanidade, pela sociedade e pela história, porque tudo está interligado, é só aprofundar seus estudos, desenvolver o senso crítico e aguçar o "desconfiômetro". Mas, para isso , é preciso estudar, sempre e continuamente. 

Oswaldo Cruz. (Revista da Semana, s/d, Charge de Bambino).  https://suportegeografico77.blogspot.com/2019/01.html
Afinal, como já disse, as coisas continuam a se repetir... Surtos de doenças e pandemias, por exemplo. Não é assunto novo. Muitas doenças e pandemias já aconteceram pelo mundo: a peste negra ou bubônica, na Europa Medieval, no século XIV; a gripe espanhola de 1918-19 no Brasil e que, apesar do nome, não começou na Espanha; os surtos de varíola, sarampo e gripe, entre os povos indígenas e em várias cidades brasileiras, por exemplo, são apenas algumas.  No Rio da Belle Èpoque, a História nos traz um episódio conhecido como A revolta da Vacina. Oswaldo Cruz, médico sanitarista, foi o responsável por combater o surto de febre amarela, em 1850, causada pelo nosso já conhecido Aedes aegypti, mas com a obrigatoriedade da vacina, a população reagiu com medo e a polícia entrou em ação. 

O que é gentrificação. Imagem:http://courb.org/pt
No caso do surto de varíola (1904), o poder público, mais uma vez, tomou medidas drásticas. João do Rio, cronista carioca, narra a chegada da varíola em seu livro Dentro da Noite, de 1910. No início do século XX, durante as obras de modernização da cidade, na gestão do então prefeito Pereira Passos, o Rio de Janeiro buscava modernizar-se, ou seja, espelhar-se na Paris da Belle Époque. Tal  modernização, chamada política do “Bota Abaixo”, consistia em uma série de intervenções que demoliram vários cortiços da cidade. E, como sempre acontece, a população pobre é a que sofre mais, em qualquer tentativa de remodelação, recuperação urbana ou reurbanização que, em outras palavras, traduz as tentativas de esconder o feio, o pobre, o distópico para passar a falsa imagem de uma cidade bela e rica.  Hoje, isso se chama gentrificação. Mudam os nomes, as doenças, os governantes, mas tudo continua igual. Até quando?  
 
Referências
https://martaiansen.blogspot.com/ 
http://www.courb.org/pt/o-que-e-gentrificacao-e-por-que-voce-deveria-se-preocupar-com-isso/