sábado, 22 de agosto de 2020

Ecos Literários | Saci Pererê e a Mata do Fundão

Minha infância foi povoada de brincadeiras em casa e na rua (quando a gente podia brincar de esconde-esconde e pega-pega na rua), cantigas de roda, música e também livros - muitos livros, livrinhos e livrões: desde o inesquecível (e nunca mais encontrado) Bitu, o Carneirinho Sujo, aos contos de fada dos Irmãos Grimm, de Hans Christian Andersen, aos fantásticos livros de Monteiro Lobato, às revistinhas do Recruta Zero e do Saci Pererê.... Aliás, se minha paixão pela Grécia e por mitologia foi despertada pelos livros de Monteiro Lobato, em especial Os Doze Trabalhos de Hércules, a Turma do Pererê influenciou decisivamente meu interesse pelo nosso folclore, nossas raízes e nossas tradições culturais. 

Obra-prima do premiado cartunista, jornalista, cronista e escritor mineiro de Caratinga Ziraldo Alves Pinto (1932), a primeira história em quadrinhos, colorida e genuinamente brasileira, Pererê, chegou às bancas em 1960, com personagens também bem brasileiros, mas saiu de cena em 1964, depois de 43 edições, suspensa pela ditadura militar (sem comentários). Tempos depois, novos números foram publicados, mas por pouco tempo. Mais tarde, virou livro de capa dura (um tesouro que guardo até hoje) e, por fim, saiu de cena (uma pena!).

Aprendi muito com os personagens da Turma do Pererê, que habitavam a Mata do Fundão (ou seria Floresta da Tijuca?). Até hoje lembro-me com alegria de todos eles, cada um com uma característica distintiva única, mas com algo em comum: todos prezavam, acima de tudo, a amizade, a lealdade e a solidariedade. Relembrando:  

Saci Pererê, personagem principal, com seus inconfundíveis cachimbo e boné vermelho, aparecia e desaparecia em seu redemoinho;   

Tininim, inseparável amigo índio do Saci;

Boneca de Piche, namorada do Saci e amiga da Tuiuiú, era filha de dona Docelina, doceira de mão cheia e mãe adotiva do Saci;

Tuiuiú, uma linda indiazinha que morava na cidade e namorada do Tininim;  

Moacir, valente, discreto e eficientíssimo carteiro da Mata do Fundão, e seu indefectível capacete com asinhas de Mercúrio;

Pedro Vieira, o tatu, amigo, ajuizado e atencioso;

Geraldinho, o agitadíssimo coelhinho de longas orelhas;  

Galileu, a doce e gentil onça-pintada, objeto de desejo dos fazendeiros locais;

Allan, o macaco comedido, gentil e maduro;

General Nogueira, a coruja sabe-tudo, que resolvia as pendengas da turma.

Outros personagens eram os fazendeiros Compadre Tonico e Seo Neném, que viviam querendo caçar o coitado do Galileu... 

 

Uma delícia ler, rir junto, aprender e me lembrar dessas histórias. Até hoje, é inevitável, cada vez que escuto um desses nomes, a primeira coisa que me vem à cabeça é a danada turma da Mata do Fundão...  Mais tarde, além de ser um dos fundadores do jornal O Pasquim, Ziraldo lançou Flicts (maravilhoso), O menino Maluquinho (fenômeno editorial), O Planeta Lilás, A professora Maluquinha, entre muitos outros livros, ganhou prêmios e medalhas, mas a Turma do Pererê foi um marco. 

 

Valeu, querido Ziraldo, você nem imagina quanto! 

 

Referências e imagens: 

http://www.pinturasemtela.com.br/ziraldo-alves-pinto-cartunista-caricaturista-e-pintor-brasileiro/

https://revistaalienum.wordpress.com/2014/11/23/entrevista-com-saci/  

http://eraumavezuem.blogspot.com.br/2012/11/perere-de-ziraldo-o-quadrinhos-pioneiro.html

sábado, 15 de agosto de 2020

Ecos Culturais | Cultura popular e folclore

Agosto é um mês muito estranho. Era o que eu pensava quando criança, um mês imenso, que não acabava mais com seus 31 longos dias de vento. E perigoso, porque os mais velhos diziam que era mês do cachorro louco. Morríamos de medo de topar com um desses bichos soltos, babando, descontrolados, vindo na nossa direção. Para nos assustar ainda mais, diziam que o antídoto para a hidrofobia - a doença resultante de uma mordida do tal cachorro - era uma injeção aplicada na barriga, todo santo dia, por não sei quantos dias... Ah, sim! Além dos tais cachorros loucos e da ideia apavorante daquelas injeções, sempre havia a possibilidade de uma das sextas-feiras do fatídico mês  cair no dia 13. Aí, então, era o caos! Alerta máximo! Acreditava-se mesmo que era dia de ficar quietinho em casa, protegido, sem fazer nada que pudesse atrair a tal onda de azar.  
 
Quem nunca ouviu falar disso? Coisas do nosso folclore, lendas, ditos e crendices da cultura popular presentes na vida de qualquer criança e de qualquer povo. De país para país, de povo para povo, mudam as crendices, mas de uma forma ou de outra, elas estão sempre presentes. Com o tempo, fui descobrindo outras lendas, simpatias, ditados e costumes dentro desse rico universo que forma a herança cultural brasileira. Aliás, o Blog Anita Plural já publicou outros posts sobre folclore. Veja aqui alguns deles: Viva São João; Folclore Brasileiro; Mário, Oneyda e Valquíria Carozze. Porém, ao se falar em folclore, alguns nomes são indissociáveis dessa incrível forma de manifestação das tradições e cultura de um povo: Mário de Andrade, Monteiro Lobato e Luis da Câmara Cascudo. 

Mário de Andrade, poeta, romancista, crítico musical, pesquisador e agitador cultural, dispensa apresentações, sobretudo depois que a Feira Literária Internacional de Paraty - FLIP 2017 homenageou seu gênio e sua obra. A Missão de Pesquisas Folclóricas é contribuição única nesse campo, não só nos estudos de música, dança, cantos e cantigas populares, mas também  no folclore infantil e dos negros. Orientou inúmeros outros pesquisadores, dentre eles a folclorista e etnóloga varginhense Oneyda Alvarenga que também era membro da célebre Missão Folclórica, valorizava a cultura local e sacudiu conceitos culturais e literários da época, com sua ação. Florestan Fernandes dizia que Macunaíma, um compêndio de folclore, é "um mosaico, uma síntese viva e uma biografia humanizada do folclore de nossa terra". (IEB, SP, 36:141-158, 1994).  

Monteiro Lobato. Nascido em Taubaté, interior de São Paulo, o escritor e tradutor é conhecido autor de obras que povoaram a infância de milhões de crianças brasileiras (a minha, com certeza) com sua fantástica coleção de literatura infantil que começava com Reinações de Narizinho e terminava com os Os Doze Trabalhos de Hércules. Além de título do livro O Saci, essa famosa personagem folclórica visitou a turminha do Sítio do Pica-pau Amarelo, onde aconteciam as aventuras dos pequenos protagonistas dessas histórias. A série Sítio do Pica-pau Amarelo foi publicada entre 1949 e 1970 pela editora Brasiliense. Mantenho ainda em local nobre e continuo admirando as primorosas ilustrações de André Le Blanc das edições publicadas entre 1949 e 1967.

12ª edição, 2012
Luís da Câmara Cascudo, outra referência na pesquisa etnográfica e no folclore do nosso país era historiador, antropólogo, jornalista e tradutor brasileiro. Escreveu mais de 30 obras, dentre elas Rede de Dormir (1959); História da Alimentação no Brasil (1967) e Civilização e cultura (1973). Sua obra Dicionário do Folclore Brasileiro (1954) é referência mundial. Foi premiado pela Academia Brasileira de Letras com o livro Geografia dos Mitos Brasileiros, recebeu dezenas de honrarias e prêmios e teve sua imagem estampada na cédula de 50 mil cruzeiros (1991), lançada após sua morte. 

Referências

domingo, 9 de agosto de 2020

Ecos Musicais | Suave timbre de uma flauta

O Brasil é um país musical: ritmos deliciosos, compositores, músicos e intérpretes maravilhosos. No nosso país continental, cada região tem um estilo, uma batida, uma característica, um qualificativo. De Minas, comenta-se que é um celeiro musical. Assim como Minas, pode-se dizer que Varginha também tem um dom musical. Uma das causas, sem dúvida, é a presença forte e continuada do Conservatório Estadual de Música Maestro Marciliano Braga (ver aqui). Desde seu início, em 1985, multidões de alunos passaram por suas salas, aulas e apresentações, seus programas, grupos, concertos, orquestras, duos, trios, etc... Muitos tomaram outros rumos profissionais, mas outros deixaram que a música os conduzisse pela vida e brilharam, ensinando, tocando e cantando, como o Duo Siqueira Lima (ver Violão a quatro mãos), entre tantos e tantos outros.
Um deles é Alexandre Braga Rezende (1977), varginhense e aquariano, que foi flautista das orquestras sinfônicas de Minas Gerais e Ouro Preto, e hoje integra o naipe de flautas da Filarmônica de Minas Gerais. Ainda criança, Alexandre iniciou seus estudos no Conservatório Estadual de Varginha com a professora de flauta Leonilda Silva, um ícone e referência do instrumento na nossa cidade. Graduou-se pela Universidade Federal de Minas Gerais-UFMG, na classe do professor Artur Andrés, e participou de vários cursos e festivais, tendo como orientadores os professores Norton Morozowicz, Odete Ernest Dias e Maurício Freire. Incentivador da música de câmara, Alexandre colabora com vários grupos de diversas formações, executando amplo repertório que vai do barroco até a música de salão.
Capa do CD Sarau, Duo de Flauta e piano, com Elvira Gomes e Alexandre Braga 
Hoje, Alexandre Braga continua ativíssimo com sua flauta. É membro correspondente da Academia Varginhense de Letras, Artes e Ciências - AVLAC, desde novembro de 2017. Mora em Belo Horizonte e é casado com a violinista Martha Pacífico. Em duo com a pianista Elvira Gomes, outra talentosa musicista de Varginha, professora de piano da Academia Lorenzo Fernandez, em Varginha, e também membro da AVLAC, gravou dois CDs e fez um sem número de recitais, incluindo apresentações históricas na Sala São Paulo, em São Paulo, e no Teatro Independência de Mendoza, Argentina.  
 
Gostaria de mais informações sobre a teoria e a prática musical? Quer saber o que é teoria dos afetos, o significado dos sons agudos ou graves, linhas ascendentes ou descendentes, tipos de andamento, desde quando a música é tocada em salas de concerto ou quem foi o grande incentivador disso? Quer saber mais sobre  o papel do intérprete, música Barroca, música de salão e sua relação com a polca europeia e com o lundu africano? Mais sobre milongas, valsas, chorinho, recitais e concertos na esfera pública?  Então, assista ao canal de Alexandre Braga, no YouTube. Dividido em Linguagem Musical, Curiosidades, CD no Canal e Brasilidades, foi pensado para os apreciadores da música, sejam eles leigos ou profissionais. Um canal comprometido com a difusão de conhecimento musical e, portanto, com o enriquecimento e emancipação da alma. Dedique seu tempo a ouvir sobre música, aprender e ouvi-lo tocar peças lindas, com gosto de quero mais.
 

Os dois vídeos aqui postados dão mostras da versatilidade e virtuose dos músicos. O primeiro, acima, dentro do subtema Brasilidades, foi gravado em Varginha e conta com a participação do violeiro local Boinho. O segundo traz uma apresentação, em Diamantina, do duo Elvira Gomes ao piano e Alexandre Braga na flauta, tocando o delicioso EL CHOCLO, milonga argentina de autoria de Angel Villoldo (1861-1919). 
  
 
Referências
https://www.youtube.com/channel/UCLeDSgg4q9goN1cBnebJ4bA