quarta-feira, 15 de maio de 2019

Ecos Linguísticos | O Pequeno Príncipe em Tupi

 O Pequeno Príncipe é um daqueles livros que a gente lê uma vez, volta a ler, revisita de quando em quando e guarda, na ponta da língua, algumas de suas frases memoráveis. É daqueles livros que lemos em várias línguas: em português, em inglês, em italiano, em espanhol e em francês; daqueles livros que são guardados no coração e na nossa biblioteca particular; daqueles livros que fazemos questão de emprestar para filhos, sobrinhos, amigos, alunos, colegas, tradutores, professores e interessados. É, literalmente, um clássico. Antoine de Saint-Exupéry acertou na mosca.
 
Foto: Guilherme S. Ribeiro
Com certeza, um dos mais traduzidos do mundo e já publicado em mais de 200 línguas, há pouco mais de dois anos, o famoso título foi traduzido do francês para o nheengatu, língua derivada do tupi e até hoje ensinada na Amazônia, nas comunidades às margens do rio Negro. Confesso que ainda não tenho O Pequeno Príncipe em tupi, mas já está na lista. A tradução foi tema da dissertação de mestrado de Rodrigo Godinho Trevisan, aluno da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo - USP. Assim, além de dar nova vida à língua nheengatu que, segundo Trevisan “já foi mais falada que o próprio português no norte do Brasil até o final do século 19”(1), a tradução permitiu, às crianças indígenas, acesso a uma joia da literatura internacional infanto-juvenil. Durante a dissertação, Trevisan visitou e conviveu com a cultura indígena e as comunidades ribeirinhas, atento ao idioma ainda vivo em cerca de seis mil índios e caboclos no Amazonas. Em algumas comunidades, o nheengatu é ensinado como língua materna, antes do português. Nos núcleos urbanos, em algumas poucas escolas, como língua estrangeira, depois do português. 

Para não ficar preso ao original, o autor pesquisou recursos linguísticos e estilísticos de ambas as culturas e, muitas vezes, optou por adaptações, neologismos e resgate de termos já esquecidos. Algumas de suas dificuldades e escolhas foram: 
- Título - o título apareceu como primeiro desafio; o termo prince, em francês, foi adaptado para um antigo “chefinho” em nheengatu (muruxawamirĩ)
- Era uma vez - o famoso início dos contos de fada (il était une fois) virou conta-se que (paa), bem comum nas lendas dos povos originários;
- Animais - o tigre foi substituído pela onça-pintada (yawareté-pinima); a raposa, por cachorro-do-mato (yawara-kaapura);
- Alimentos - o trigo (blé) foi substituído por milho (awatí) e a couve (chou), por caruru (karurú);
- Asteroide do principezinho - o “asteroide” foi traduzido como estrela (yasitatá).  
Com relação ao famoso baobá do original, o tradutor explica que não foi possível adaptá-lo visualmente a uma árvore da Amazônia e, nesse caso, ele optou por conservar o nome baobá, já que o livro manteve a ilustração.

Que fantástica oportunidade e que belo trabalho! Que alegria deve ter sido fazer essa tradução, difundir essa língua, pouco conhecida entre tantos de nós, e levar alegria, conhecimento e novidades àquela linda cultura. Que a história continue na História, que novas edições desse belo livro possam surgir e que novos livros sejam traduzidos para o chamado tupi moderno!

Notas:
(1) Ferreira, Ivanir. jornal.usp.br/?p=79132
Referências:

14 comentários:

  1. Também amo este livro. Deve ser linda a tradução. Lembra o Guarani.
    Parabéns por mais esta. Bjs
    Ione

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    1. Querida Ione, obrigada pelas suas palavras. Vc é figurinha imprescindível aqui. Beijos
      Anita

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  2. Respostas
    1. Eu também, obrigada pelo retorno, mas não se esqueça de assinar.
      Um abraço
      Anita

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  3. Este livro é inesquecível. Ainda mais usando termos indígenas. O pequeno Príncipe sempre será grande de ensinamentos.

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    1. Sempre, é verdade! É um livro atemporal. Obrigada por comentar, mas lembre-se de deixar seu nome no corpo da mensagem. Abraços
      Anita

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  4. Cara, ótimo texto para exaltar a recriação em tupi da obra universal de Exupéry.
    Registro também que viveram em Lambari dois dos maiores conhecedores da língua tupi: O padre e literato ANTÔNIO LEMOS BARBOSA e o escritor, professor e folclorista BASÍLIO DE MAGALHÃES, autores dos quais já falamos em nosso blog: http://guimaguinhas.prosaeverso.net

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    1. Olá, Guimarães. Que Beleza, não? Escondidinhos em Minas...E esse conhecimento tem de ser divulgado, mesmo. Obrigada pela visita e apareça sempre... Grande abraço
      Anita

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  5. Oi, vc tem o @ do Rodrigo Trevisan?
    Sou fã e tenho e vários dialetos e idiomas e português. Tenho interesse e contactar.obrigada

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  6. Olá, Marisa. Tenho, sim: rodrigogtrevisan@gmail.com
    Obrigada pela visita. Será sempre bem-vinda.
    Um abraço
    Anita

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  7. Que fantástico! Mas sabe se há o livro para comprar?

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    1. Olá, Imagino que sim, mas talvez seja bom vc falar com o tradutor. Segue o email dele: rodrigogtrevisan@gmail.com . Obrigada pelo contato, abraços
      Anita

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  8. Olá, acho que você pode ver na Amazon, mas de qualquer forma, segue o e-mail do tradutor. rodrigogtrevisan@gmail.com . Obrigada pela visita.

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