sexta-feira, 11 de novembro de 2022

Ecos Literários | E agora, José?

Carlos Drummond. Divulgação
Conhecido, sentido e mil vezes repetido, o poema E agora, José? (1942) do poeta Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) sempre tocou meu coração. Descobri, há algum tempo, que também tocou o coração de outro José, que também leu o poema e escreveu uma crônica sobre o outro  José, o de Drummond.  
 
Falo daquele outro escritor, também hábil no manuseio das palavras, também humanista, também desalentado diante da situação do mundo, também defensor de uma ação mais solidária e menos individualista, também defensor da justiça social e da ética, e também autor de uma literatura forte e inconfundível. Falo do português José Saramago (1922-2010), ganhador de inúmeros prêmios como o Nobel de Literatura (1998) e o prêmio Camões (1995). Retomo apenas alguns trechos de sua crônica.
 
José Saramago. Divulgação
Há versos que se transmitem através das idades do homem, como roteiros, bandeiras, cartas de marear, sinais de trânsito, bússolas- ou segredos. Este, que veio ao mundo muito depois de mim, pelas mãos de Carlos Drummond de Andrade, acompanha-me desde que nasci, por um desses misteriosos acasos que fazem do que viveu já, do que vive e do que ainda não vive, um mesmo nó apertado e vertiginoso de tempo sem medida. 
Considero privilégio meu dispor deste verso, porque me chamo José e muitas vezes na vida me tenho interrogado: “E agora?” Foram aquelas horas em que o mundo escureceu, em que o desânimo se fez muralha, fosso de víboras, em que as mãos ficaram vazias e atônitas. “E agora, José?” Grande, porém, é o poder da poesia para que aconteça, como juro que acontece, que esta pergunta simples aja como um tônico, um golpe de espora, e não seja, como poderia ser, tentação, o começo da interminável ladainha que é a piedade por nós próprios.  
[...]    
Mas outros Josés andam pelo mundo, não o esqueçam nunca. A eles também sucedem casos, desencontros, acidentes, agressões, de que saem às vezes vencedores, às vezes vencidos. Alguns não têm nada e ninguém a seu favor, e esses são, afinal, os que tornam insignificantes e fúteis as nossas penas. 
 

Referências

http://www.algumapoesia.com.br/drummond/drummond14.htm

https://www.mundovestibular.com.br/estudos/resumo-de-livro/antologia-poetica-carlos-drummond-de-andrade-resumo-2/   

10 comentários:

  1. Gostei demais!Dois grandes José! Beleza!Amor! E agora Jose?sem vocês dois mas,como foi dito também há outros José de lindos sentimentos.

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  2. Cheguei aos 92 anos (dezembro/2 022) e.me pergunto: e agora José (,josé Campos)

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    1. Agora, José, é ainda aproveitar o tempo para ensinar a cuidar dos outros José, doidos, sofridos.. Abraços

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  3. E agora que cada vez tem menos Jose na lista de chamada? Um professor chamado Zé.

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  4. Que grande força (forças) nesses dois Josés... E quando se amplia a luta para os mais Josés... aqueles de quem disse Saramago, os que não têm nada nem ninguém a seu favor... doído.
    Mas em tudo isso tem a beleza da poesia.

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  5. Anita, maravilhoso o seu texto. Agora, falar de Carlos Drummond de Andrade requer uma boa dose de beleza poética, algo que o seu texto consegue passar para quem o lê!

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