sexta-feira, 4 de novembro de 2022

Ecos Humanos | "Arre! Estou cheia de semideuses "

Leitora assídua do blog Anita Plural, a psicanalista Lilian Conde, em seu comentário no post Novos Termos. Sinal dos tempos?, cita uma frase de Álvaro de Campos, um dos heterônimos de Fernando Pessoa (1888-1935). Retirada do Poema em Linha Reta, a frase diz: “Arre! Estou farto de semideuses! Onde há gente no mundo?" Leia o poema todo aqui. 
Peço licença à gentil amiga para repetir suas palavras: “Parabéns, Anita, pela feliz ideia de de utilizar os neologismos como sintoma de uma sociedade não solidária, entupida de antidepressivos, voltada exclusivamente para si, que pisoteia os desiguais”.

Que retrato doído de nossa sociedade, não? Que retrato doído da nossa civilização... Que espelho embaçado.... Como o espelho de Mia Couto (aqui) que mostra um pouco de como estamos, o que estamos, onde estamos, mas jamais como somos. Porque somos múltiplos, sim, mas sobretudo e infelizmente, somos míopes, mestres em nos fechar em bolhas, em dourar a nossa própria pílula, rotular o outro e usar superlativos, muitos superlativos – o melhor, o maior, o mais isso, o mais aquilo. Ninguém tem problemas, tristezas, dúvidas. Só certezas. As dúvidas são dos outros. 

Seria esse o tal Complexo de Bailarina, da famosa Ciranda da Bailarina do álbum O Grande Circo Místico, de Edu Lobo e Chico Buarque? Todo mundo tem, só a bailarina é que não tem... Na imagem refletida, projetada por nossos medos e nossa arrogância, vemos semideuses poderosos, infalíveis e não a imagem real – arremedos de uma sociedade mesquinha, intolerante, individualista e preconceituosa, que não gosta de refletir sobre sua própria história.   

Pura ilusão! Somos aprendizes, eternos aprendizes. Estamos aqui para aprender e aqui continuaremos até aprender as lições da solidariedade, da humildade e do amor. Por isso, só posso repetir a frase brilhante: ”Arre! Estou farto de semideuses! Onde há gente no mundo?". 

Referências
https://www.youtube.com/watch?v=DP4jqyVGjMM 
https://www.youtube.com/watch?v=1yz7NLcC_mk   

8 comentários:

  1. Que texto ótimo, Anita! Precisamos imaginar que somos semi-deuses por que não suportamos ser humanos. Viver de ilusões é mais fácil! Vivemos num sonho! Pisoteamos os desiguais por que nos falta a consciência de nossa vulnerabilidade e da impermanência da vida. Não somos capazes nem de cogitar a possibilidade de que, quando estivermos velhos e frágeis, estaremos nas mãos, exatamente, daqueles que excluimos. São eles que cuidarão de nós! Dependeremos de sua compaixão. A não ser que ocorra uma morte súbita prematura! Ah, esqueci que Deuses são imortais!

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    1. Oi, Lilian, você não assinou, mas imagino que seja você... Minha única pergunta é: quando será que vamos aprender? obrigada, querida, abraços

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  2. Viva a simplicidade do seu Dito, do seu Cido, do so Mane bambino,, do Chico Trepado, melhor queijo de Cajuru..gente simples que toca sua vida, produz o seu sustento, gosta de prosear e respeita quem pensa diferente.

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  3. É, infelizmente vivemos no mundo do faz-de-conta! Passamos a vida toda buscando o viver ideal e não vemos que ele está sempre na nossa frente! Quando iremos acordar????? Bjs, Anita!

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  4. Magnífico texto.
    Sim, o oculto debaixo dos nossos olhos. Egoísmo para esconder que somos pequenos.
    Tantos problemas... necessidade de ver o outro, olhar o outro. Principalmente ser o coletivo. A compaixão.

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  5. Oi Anita. Isso mesmo. O velho pessoa.Estou farta de semideuses, de celebridades, de influencer. Da ignorância e cegueira que assola o país.

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    1. Exato......parece que ninguém mais tem identidade própria .. e as pessoas têm que ficar copiando os que ditam a "moda" ...tô fora....

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