Continuando o post anterior sobre a "peste moderna" (se ainda não leu, leia aqui), representada sobretudo pelo tráfico de drogas e armas, crime organizado e pelas milícias, vale destacar que, das chamadas drogas “lícitas”, o álcool é a primeira a ser combatida. Duvida? Basta dar uma olhada, por exemplo, nas cidades menores para verificar como o consumo de álcool começa cedo e em todos os lugares, como se nada
mais houvesse a ser feito para preencher o tempo. Daí a importância do Estado, de políticas públicas e
programas intersetoriais abrangentes, envolvendo saúde,
assistência social, habitação, educação, emprego, cultura e esportes, além de uma firme política antidrogas.
Um bom exemplo foi o programa De Braços Abertos,
na
gestão (2013-2016) do então prefeito de São Paulo, Fernando Haddad. O programa oferecia, aos
dependentes, três ações profundamente interligadas: Teto, Tratamento e
Trabalho (os três Ts). Dados da prefeitura mostram que mais de 80% dos dependentes se
engajaram e diminuíram o vício na época. Infelizmente, com a mudança de governo o programa foi descontinuado. É claro que a sociedade civil pode e deve participar de ações de combate às drogas, mas uma política antidrogas séria e eficaz deve ser política de Estado, não de
governos transitórios. Igualmente, é também dever do Estado retomar as cidades das mãos do
crime
organizado e das milícias, grupos que se organizam e cobram da comunidade por "serviços
prestados". Quando o Estado não age com lucidez e firmeza, a população fica à
mercê dessas
milícias que, aparentemente, se colocam ao seu lado, mas cujo único intuito é enriquecer e obter poder a qualquer custo.
Desde os anos 1990, por meio da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (SENAD), o Ministério da Justiça promove programas e discussões sobre o tema, como repressão da produção, controle do tráfico de drogas, programas terapêuticos, prevenção do
uso, reinserção social de usuários e dependentes etc. A sociedade civil, via movimentos sociais, instituições religiosas (espíritas, católicas,
evangélicas, budistas e outras) e médicas, representantes das comunidades
científica e acadêmica também desenvolvem atividades visando desintoxicar, recuperar e ressocializar os dependentes químicos. Sem dúvida, é uma contribuição muito válida, mas para maior efetividade desses programas, as ações exigem equipes multidisciplinares, atuando sob um mesmo denominador comum, pois a perspectiva de sucesso é sempre mais real quando se trabalha em conjunto e de forma coordenada.
Por outro lado, se é evidente que é preciso auxiliar dependentes e suas famílias com grupos de
apoio, é preciso lembrar que não se pode acobertar quaisquer delitos, pois cada um deve assumir a responsabilidade pelos próprios atos. Ensinar essa responsabilidade aos filhos é, desde sempre, o primeiríssimo dever dos pais. Agora,
é imprescindível e urgentíssimo criminalizar
os traficantes, o crime organizado, as milícias, esse poder paralelo
que atinge e corrompe as esferas públicas, privadas e instituições como
um câncer, que se espalha sorrateiramente por todas as classes sociais,
campos profissionais e esferas políticas.
Nesse
universo, talvez e só talvez, a visão de religiões reencarnacionistas, como a doutrina espírita por exemplo, pode ser um diferencial lógico,
a partir da concepção de pluralidade das existências, lei de ação e reação, e justaposição dos mundos espiritual e material.
Ou seja, fica clara a noção de causa e consequência e de como cada um afeta a própria vida a partir de suas ações, opções e modos de ser, pensar e agir. É aquela noção clássica: se plantou espinhos, não vai colher rosas.
Porém parece que falhamos redondamente como sociedade.
Desistir? Jamais. Mais do que nunca é preciso agir, continuamente e em conjunto - Estado, sociedade e cada um de
nós, na condição de pais, filhos, irmãos, professores, cidadãos, pois não vivemos isolados, mas em sociedade. Juntos devemos lutar para destronar esse poder paralelo, esse flagelo dos
tempos modernos. Como bem disse Guimarães Rosa, "o que a vida quer é coragem". Por
isso, à simples ideia de ter filhos, os pais devem pensar sobre que tipo de tendências e valores querem transmitir aos descendentes. Para começar, devem trabalhar em si mesmos com consciência, no corpo e na mente, para transmitir aos filhos uma herança genética benéfica: primeiro um parceiro deve cuidar de si e do outro; depois, juntos cuidam do bebê, inclusive fortalecendo-o não só física e emocionalmente, mas também no aspecto moral, exemplificando, ensinando-lhes noções de certo e errado, resiliência, justiça,
ética, força de vontade, coragem, perspicácia e discernimento para separar o joio do trigo.
É preciso ensinar-lhes que não estamos aqui a passeio, mas a trabalho; que dissabores e alegrias, sonhos e pesadelos, ganhos e perdas fazem parte da vida, mas que é preciso enfrentar a tentação, superar a busca pela saída 'enganosamente' mais fácil e não ceder às soluções mágicas. É essencial, desde cedo, ensinar-lhes que é preciso esforçar-se e ter coragem para enfrentar o que vier para
que quando partirmos nossa ação possa ter deixado um mundo melhor aos nossos descendentes. Acreditem ou não, queiram ou não, é
para isso que estamos aqui. Então, mãos à obra. Para ontem!
Referências
https://correio.news/entrevista/maria-heloisa-drogadicao-o-papel-social-da-religiao
https://haddadoficial.com.br/criado-por-haddad-de-bracos-abertos-fez-88-dos-dependentes-da-cracolandia-diminuirem-o-vicio/
https://casadespertar.com.br/como-lidar-com-dependente-quimico-tratamento/
https://coterem.com.br/noticia/18-passos-para-ajudar-um-dependente-quimico/
https://correio.news/leitura/o-traficante-um-livro-revelador-do-mundo-das-drogas
Políticas públicas e educação são duas das maiores deficiências do Estado. Desde sempre.
ResponderExcluirMas nem por isso devemos desistir; ao contrário, quanto mais insistirmos melhor...e, não se esqueça, o Estado somos nós, com nossas escolhas, com quem escolhemos para nos representar. Abraços....
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirMuito bom Anita. Até porque temos a impressão que nada se faz hoje em dia, só se tira essa população da vista. Precisamos escolher que vai nos representar agora!
ResponderExcluirObrigada, Cris ...como eu disse, é preciso saber escolher, não esquecer do ser humano e do todo. Beijos e obrigada .
ExcluirExcelente Anita. A droga mais prazerosa deve ser a vida..e é desde que se permita viver com dignidade e que se ofereça a possibilidade de novas experiências aos jovens e, principalmente, perspectiva de futuro, de sonhar.
ResponderExcluirSim, estar vivo e poder sonhar é um privilégio...a outra opção não é a melhor .. obrigada por comentar. Abraços
ExcluirSim, Anita: o Estado somos nós, como vc nos lembra. E quando você fala de coragem, vejo também sua firme coragem em escrever esse texto. Muito bom!
ResponderExcluirMuito Anitinha! Você foi corajosa mesmo de escrever este texto.Devemos melhorar nossa atenção em escolher nossos políticos e ver os que querem fazer o bem ao próximo. Bebel
ResponderExcluirGosto da frase, acho que de W. Reich: amor, trabalho e conhecimento são as fonte de nossa vida. Deveriam também governá-la.
ResponderExcluirO uso de drogas só agrava a droga de vida decorrente de dificuldades de diversas ordens. Educação e vontade política são imprescindíveis. Pena que os 3 Ts de Haddad não tenham sobrevivido para que pudéssemos aferir o resultado dessa política a longo prazo...
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