quinta-feira, 27 de março de 2025

Ecos Linguísticos | Serendipity

Volta meia retorno ao fantástico universo das línguas, suas origens, usos diversidade, expressões características e sonoridade. Sim, porque é verdade que todas têm uma sonoridade própria e, mesmo estranhos, alguns termos nos atraem e encantam, sem nem sabermos porquê. Em inglês, serendipity é um desses termos. Nos dicionários, como tradução, encontramos o termo serendipidade, um baita anglicismo. Estranhíssimo, não? O termo significa uma feliz descoberta feita ao acaso; uma agradável e inesperada coincidência, algo que vem a calhar, sem que tenhamos procurado por aquele resultado. Por exemplo, quando estamos escrevendo ou traduzindo e ficamos empacados com algum trecho, algum termo: alguém chega e diz qualquer coisa, uma palavra que cabe direitinho na nossa frase. Serendipity

Muitos relacionam esse termo a destino. Bem, eu diria que estão amarrados. Afinal, não há acaso. Ou há? Talvez, algo como estar no lugar certo e na hora certa. Por que fomos parar lá e descobrimos algo feliz? Vai saber... Sincronicidade? Serendipity? O fato é que algo (o trabalho, o destino, a sorte, a vida, nossa própria busca, o acaso) nos levou até lá... Então, uma feliz descoberta por algo não procurado intencionalmente, talvez, seja a tradução mais apropriada, embora mais longa.

Origens. O termo serendipity foi cunhado, em meados do século século 18, pelo escritor, historiador e político britânico Horace Walpole (1717-1797). Ele extraiu o termo de um conto de fadas persa chamado The Three Princes of Serendip, nome árabe da região onde hoje está o Sri Lanka. O conto falava de personagens que, com sagacidade e o tempo todo, faziam descobertas acidentais. Walpole acrescentou o sufixo inglês TY, ao termo Serendip e criou o substantivo serendipity. Além do novo substantivo, cunhou ainda o adjetivo serendipitous, acrescentando o sufixo OUS, e o advérbio serendipitously, juntando o sufixo LY ao adjetivo. Como sabemos, a língua é viva, então...

Repercussão. Em artigo muito interessante intitulado The three princes of Serendip: Notes on a mysterious phenomenon (ver aqui), o Dr. David R. Colman, médico e diretor do Instituto Neurológico de Montreal, afirma que essa feliz descoberta ao acaso tem um papel relevante em todo tipo de pesquisa, mas que atua dentro de determinado ambiente. Cita três cientistas que, de certa forma, também se referiram a esse termo:

- Joseph Henry, físico e primeiro diretor do Instituto Smithsonian: “The seeds of great discoveries are constantly floating around us, but they only take root in minds well prepared to receive them.” Em tradução livre: As sementes de grandes descobertas estão constantemente flutuando em torno de nós, mas só criam raízes em mentes bem preparadas para recebê-las.

- Louis Pasteur, conhecido cientista francês: “Chance favors the prepared mind.” Em tradução livre: O acaso favorece as mentes preparadas.

- Alexander Fleming, descobridor da penicilina: “Nature makes penicillin, I just found it; one sometimes finds what one is not looking for.” Em tradução livre: A natureza faz a penicilina; eu só a encontrei; às, vezes, o indivíduo encontra algo que não estava procurando.

Dentre outras frases tiradas do Cambridge English Corpus uma delas destaca que em descobertas arqueológicas, por exemplo, pode-se ter um elemento real de serendipity. Isso, porém, não exclui, de forma nenhuma, os estudos e o esforço sistemático dos interessados nos temas em questão.

No universo menos científico, o termo remete ao mundo dos cinéfilos e pode ser lembrado por Serendipity (The Gloves), filme lançado em 2001. Em português, Escrito nas estrelas, com John Cusak e Katie Beckinsale nos papéis principais. É uma comédia romântica que fala dos encontros e desencontros de um casal: eles se conheceram numa loja, se apaixonaram, nunca mais se viram e, anos depois, voltam a se procurar  convencidos de que um dia acabariam juntos.   

Referências

https://www.merriam-webster.com/dictionary/serendipity

https://pmc.ncbi.nlm.nih.gov/articles/PMC2323527/

https://pt.wikipedia.org/wiki/Serendipidade

https://dictionary.cambridge.org/dictionary/english-portuguese/serendipity

https://www.significados.com.br/serendipity/

https://www.imdb.com/pt/title/tt0240890/?reasonForLanguagePrompt=browser_header_mismatch

https://www.kent.ac.uk/ewto/projects/anthology/horace-walpole.html  

11 comentários:

  1. «As sementes de grandes descobertas estão constantemente flutuando em torno de nós, mas só criam raízes em mentes bem preparadas para recebê-las«.
    O que me preocupa é que as mentes que se desenvolvem em tempos de «brain root« não são terreno fértil para uma boa semeadura. Oremossss

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Érica, querida. Da próxima vez, não se esqueça de assinar. Vc tem muito a dizer... Beijo grandão

      Excluir
  2. Muito interessante e rico!

    ResponderExcluir
  3. Que boa surpresa esse seu texto, Anita. Zé Marcelino

    ResponderExcluir
  4. Le osservazioni che fai sono di particolare interesse e molto stimolanti per qualsiasi lingua.
    Un grande abbraccio Tonino

    ResponderExcluir
  5. Como sempre, um prazer ler os teus textos, Anita!

    ResponderExcluir
  6. Assunto muito interessante Anitinha. Bom conhecimento! Bebel

    ResponderExcluir
  7. E mais fico acrescentada lendo seus textos magníficos. Que fantástico!

    ResponderExcluir
  8. Amiga seus textos sempre instigam a mente!! Muito bom!! Obrigada!! Fátima Terra

    ResponderExcluir