quarta-feira, 3 de outubro de 2018

Ecos Urbanos | Conviver é perigoso!

Pedrita, Wilma, Fred, Barney, Betty e Bam-bam...
Geniais personagens da série dos anos 1960, Os Flinstones.
Conviver é perigoso! Peço licença ao grande Guimarães Rosa para parafrasear sua célebre frase 'Viver é perigoso'. As relações sociais, hoje em dia, deixam transparecer a ideia de que as pessoas não querem mais viver em comunidade. Querem se isolar cada vez mais em condomínios fechados, em carros blindados, atrás da tela de um computador negando a cidade, os encontros, o espontâneo, a convivência, a vida. Agressividade, ofensas e calúnias nas redes, sociais; falta de educação e violência no trânsito, vandalismo e depredação de bens públicos praticados por todas as classes sociais, grosseria no trato com as pessoas em qualquer lugar e por aí vai. Não existe mais cordialidade, civilidade, gentileza, cuidado com o outro. O que parece existir é um 'salve-se quem puder' geral...   

Não é fatalismo nem pessimismo. É simples constatação do que de fato acontece: o individualismo crescente é assustador em nossa sociedade. Basta observar as nossas cidades: além da violência cotidiana que nos rodeia, além da deficiência de moradia, de serviços públicos, segurança, transporte, saúde, educação e lazer para o corpo e para a alma, sobretudo para os mais pobres, já excluídos por um sistema injusto e inaceitável, convive-se ainda com o lixo que se acumula junto aos meios-fios das ruas e das calçadas malcuidadas, com os canteiros das praças cheios de tocos de cigarro, com plantas e árvores sem manutenção, sem carinho, com lâmpadas queimadas na iluminação pública (onde ela existe) e muito mais. Esquece-se de ver e pensar no macro, no todo, para se fixar no micro, na filigrana, no próprio umbigo.  

O desrespeito para com o outro é gritante por parte de uma parcela significativa da nossa sociedade. Cada um busca só ver o seu interesse: pegar o melhor lugar, garantir a melhor posição, defender seu ponto de vista e justificar-se com o famoso bordão "todo mundo faz" ou "é meu direito". 

Sim, mas os deverem não podem ser esquecidos. Direitos não caminham sozinhos, há sempre a contrapartida. Que cada um faça um autoexame em suas relações e atitudes, nos diversos lugares que frequenta. Não se respeitam faixas de pedestres ou de ciclistas, sinalização viária, quaisquer regras, leis, direitos do outro e, muito menos, princípios morais e éticos. Nada.  Parece que voltamos ao tempos em que éramos todos trogloditas, lutando pela sobrevivência, usando tacapes, machados e lanças para sobreviver... O mundo parece ter-se transformado em um um imenso vale-tudo, no qual o ser humano nada vale... Grande, imenso engano! 

Civilidade é um termo de origem latina (civilitas, atis) (sin. ger.: cortesia, urbanidade, gentileza, polidez; ant. ger.: incivilidade). É assim definida, segundo os nossos maiores dicionários: 
   Aulete (s.f.):
1.  Caráter do ato ou comportamento que segue os costumes relativos à boa convivência entre cidadãos, ou as convenções de demonstração de consideração e respeito mútuos:  A civilidade de seu gesto causou boa impressão.
2.  Observância às formalidades ou convenções entre os membros bem-educados de uma coletividade: Quanta falta de civilidade!
3.  P. ext. Caráter da pessoa bem-educada, que age com (mostras de) dignidade, consideração e respeito pelos outros: Reconheceu a grandeza e a civilidade do adversário. 
      Aurélio – ci.vi.li.da.de
s. f. 1. Observância das formalidades e conveniências em uso entre as pessoas  que vivem em sociedade. 2. Polidez, urbanidade, cortesia.
     Houaiss– (substantivo feminino)
      1. conjunto de formalidades, de palavras e atos que os cidadãos adotam entre si para demonstrar mútuo respeito e consideração; boas maneiras, cortesia, polidez
      2. o fato e a maneira de observar essas formalidades

Pronto! Mais claro, impossível. Sofremos de incivilidade, estamos na fase do cada um por si e ninguém por ninguém. O foco distorcido desse modo de agir faz com que o indivíduo se esqueça de que ele não está sozinho no mundo. Ele se esquece do outro, que vai além da própria família; ele se esquece da comunidade imediata, da cidade e do país. Acreditem, tal comportamento não é privilégio de nenhuma classe social ou profissional, de nenhuma raça, de nenhum grupo. Há exemplos desse comportamento em toda a sociedade brasileira, nos mais diversos lugares, postos e posições, embora haja atitudes extremas por parte de alguns cidadãos. 

Confesso que estou ficando desanimada com o ser humano, com o bicho-homem. A ciência sempre nos ensinou que o homem era o único animal racional, mas estou começando a duvidar dessa racionalidade, tamanhos são os absurdos que temos presenciado nos tempos que correm. Desde a intimidação e o deboche que crianças e adolescentes sofrem de membros de seu próprio grupo, o menosprezo de uma classe por outra ou de um grupo social por outro, de uma religião por outra, muitas vezes, chegando às vias de fato, à violência física, por motivos inimagináveis. Vale e já está mais do que na hora de pararmos para uma reflexão, um mea-culpa e de modificar nossa atitude.

Quando é que o homem vai aprender que somos todos interdependentes? Que ele é parte da Natureza? É famosa a resposta de um líder indígena a um presidente norte-americano, no final do século 19, a propósito da compra de suas terras pelo governo: "O que se fizer à Terra se fará aos filhos da Terra". Estendendo o sentido da frase para o homem, o que fizermos ao outro, como parte do corpo social, faremos a nós mesmos. As grandes religiões e linhas espirituais estão de acordo nesse aspecto: não se avança na escala evolutiva sem antes ter dado a mão e ajudado outros a assumirem sua posição. 

Civilidade se aprende em casa, com os pais, com os mais próximos primeiro, com a família, com a comunidade imediata, com o bairro; aperfeiçoa-se na escola e pratica-se na cidade, no campo, no ar, no mar, onde o indivíduo estiver, por toda a vida. Sem isso, seremos uma sociedade cada vez mais excludente e a caminho da barbárie e da autoaniquilação.  
Para terminar e para aliviar o texto, sugiro que leiam aqui um ótimo artigo sobre a famosa série da década de 1960, Os Flintstones, cuja foto abre este artigo.

5 comentários:

  1. Kudos para seus pensamentos e ótimo texto! :)

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    1. Olá, Rosângela... obrigada pela visita... Tempos difíceis, não?
      abraços e volte sempre...

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  2. Adorei o texto. Amo esta frase do índio americano. Vou copiar hoje. Especialmente,hoje. Beijos,amiga.

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  3. Querida Ione, se43mpre se esquecendo de dizer seu nome... :) É uma prazer e uma alegria ser sua amiga e ter seu apoio. Obrigada, beijos
    Anita

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