quarta-feira, 5 de maio de 2021

Ecos Culturais | Dança Circular Sagrada

 Via Lactea. Imagem:misteriosdouniverso.net
Há alguns anos, participei, em Varginha, de alguns encontros de dança circular. No entanto, aquelas poucas vezes me marcaram e, desde então, sou atraída por aqueles círculos, passos e movimentos ritmados.  Quando estávamos na grande roda, lembro-me das manifestações de apoio, pertencimento, sororidade  (por acaso, o grupo era só de mulheres) e empatia. Para todos, o equilíbrio estava no companheiro e no centro da roda. Todas aquelas pessoas eram essenciais para o todo. Mas só anos depois é que fui buscar conhecer a origem, o desenvolvimento e os benefícios das danças circulares sagradas.  

O que é dança circular? É um trabalho terapêutico, uma dança coletiva em roda que busca integrar o grupo e desenvolver equilíbrio, autoestima, paciência, empatia e sensação de pertencimento. Todos têm o mesmo ritmo, de mãos dadas, dando e recebendo apoio. No final, cada elemento da roda percebe a ressonância do movimento no conjunto e dentro de si. É uma outra forma de meditação em movimento, através da dança.

Por que circular? Porque o círculo é sinônimo de completude, totalidade e integração; é uma das muitas figuras geométricas, além de linhas, pontos, triângulos, quadrados e losangos, que formam as mandalas, presentes nas danças de roda dos povos antigos nas celebrações dos grandes acontecimentos: mudança de estações, colheitas, nascimentos, casamentos... Dançar  de mãos dadas transforma o grupo em uma enorme mandala.

Por que sagrada? Porque como símbolo arcaico e cultuado em várias culturas, o círculo é uma figura sagrada; porque a dança circular celebra a vida, o pertencimento, o todo; porque a vida é sagrada e cada um de nós é sagrado.

Qual o objetivo? Certamente, não é aprender a dançar ou fazer apresentações, embora isso aconteça nos encontros sobre o tema. A dança circular é uma forma de autoconhecimento, de volta para dentro, resgatando a simbologia das várias tradições ancestrais que carregamos. Hoje faz parte do rol das práticas integrativas do nosso sistema público de saúde (SUS). Viva o SUS!

   Vem, te direi em segredo aonde leva esta dança.
(Rumi, poeta persa)

Quais os benefícios? Além de ser uma forma de autoconhecimento e meditação em movimento, sua prática ativa o estar presente, a consciência corporal, a coordenação motora, a noção de ritmo e  de equilíbrio; valoriza atitudes cooperativas e a empatia, aumentando a autoestima. No círculo, ninguém se sente só, cada um se reconhece como elo importante de um todo, cada um compreende a força da Vida vibrando em si e no outro, da mesma forma e todo o tempo.

Bernhard Woisien. Fonte:

 Onde e como começou?  Foi resgatada pelo bailarino, coreógrafo e desenhista polonês Bernhard Wosien (1908-1986). Chegou a cursar Teologia, mas logo se dedicou à dança. Mais tarde, dedicou-se a pesquisar o lado simbólico das danças folclóricas dos povos na vivência cotidiana do sagrado. Em 1976 foi convidado a visitar Findhorn, comunidade espiritual fundada por Peter Cady, em 1962, na Escócia. Lá, Wosien encontrou equilíbrio e receptividade. Fez uma atividade experimental com os moradores e levou, à Europa Central, os resultados, incorporando o simbólico e outras formas contemporâneas, sistematizando o que se chama "danças circulares sagradas", como uma forma de meditação em grupo e na dança. 

No Brasil, a técnica chegou por intermédio de ex-moradores de Findhorn: Carlos Solano, que viveu lá nos anos 80 e foi aluno de Anna Barton, outro ícone dessa dança; e com Sara Marriot, escritora e pensadora americana que, morou na comunidade por 12 anos. Aos 75 anos, Sara veio ao Brasil pela primeira vez, em 1983, a convite do Centro de Vivências Nazaré (hoje Nazaré Uniluz) e, no final de 1984, ela se muda de vez para Nazaré. Aos 93, volta aos Estados Unidos, onde morre no ano 2000, aos 95 anos.

Vamos dançar? Alguns vídeos mostram na prática essa técnica.   

1-  O primeiro mostra fragmentos de danças circulares, em Belém, no Pará. Vídeo de Amanda Mello. Música: Me and My Cello (Happy Together)<https://www.youtube.com/watch?v=JqjWRRl2zGY&feature=emb_logo>    

2- No segundo, a focalizadora Renata Ramos, referência na área, explica o que a dança circular e Findhorn significam para ela. <https://www.youtube.com/watch?v=gJFsADBFW7Y>.  

3-  O último, mais longo, é uma entrevista com Maria-Gabriele Wosien (1950), filha de Bernhard W. Formada em literatura e doutora em narrativas folclóricas russas, seguiu os passos do pai e colaborou com ele no desenvolvimento da prática. <https://www.youtube.com/watch?v=nJeaJtUDA40>. 

Referências

http://www.sacreddance-wosien.net/

https://www.cristianamenezes.com.br/danca-circular/

https://www.dancascirculares.org/bernhardwosien/  

https://nazareuniluz.org.br/historia/

https://pt.wikipedia.org/wiki/Dan%C3%A7a_circular_sagrada

14 comentários:

  1. Linda a sua lembranca desta dança circular amiga. O círculo é o todo, completude e partes num todo integrado

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    1. Pelo "amiga", acho que é a Maria Inês. Você também estava nesse grupo com a Calu, lembra? Obrigada, meu bem, mas deixe seu nome da próxima vez. beijos

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  2. No círculo já nao sou eu que danço, que ando,que paro. E sim ,a roda dança, a roda anda ,a roda para. Todos interligados numa só emoção.
    Beijos,amiga

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    1. Ione, querida! Mais do que qualquer um, você, como professora e a autora de Brinquedos Cantados, sabe o significado do da roda, da dança, do grupo, né? beijos

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  3. Muito legal e ilustrativo. Parafraseando Caetano: Gente é pra dançar, não pra morrer de fome.
    bjs.
    Carlos SA

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  4. Em Israel, há muitos grupos de dança circular. Uma amiga ia dançar com um grupo que se encontrava numa praia de Tel Aviv. Nunca fui, mas depois desse texto, fiquei curiosa e vou procurar onde tem aqui em Paris. Obrigada por essa informação tão especial.

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    1. Oi, Arina! É verdade, agora que você mencionou, eu me lembrei da época da Faculdade. Havia uma colega de Israel que dançava. Só a vi uma vez, mas era dança de roda, com lindos movimentos. Você vai gostar e se divertir, dá para desestressar mesmo! Beijos!

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  5. Que delícia a dança circular.A dança faz bem ao corpo e a alma.Giramos de um lado a outro e podemos nos olhar e ver o encantamento entre todos.Bebel

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  6. Anita, querida! fiquei encantada como você foi capaz de expressar pelas palavras o que só conseguimos sentir quando estamos dançando. Que venha a Dança Circular para Varginha. Parabéns! Denise

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    1. Oi, meu bem! Pois pensei justamente em você para isso... Quem sabe, vamos pensando! Beijos

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  7. Como é importante o coletivo!
    Essas práticas são necessárias.
    Fiz Biodança dos 20 aos 21 anos. Sofri um acidente. Voltei a fazer aos 26. Resolvi cursar a docência na Escola Paulista de Biodança. Fiquei ali até meus 34. A diretora, Maria Luías Appy (Marlise) morreu ano retrasado, aos 91.
    São incontáveis os recursos que a gente obtém nessas vivências.
    Não demorou muito pra eu perceber que quando uma ou mais pessoas faltavam a roda não se rompia. Não há ocos nem ausências na roda. Enfim... tudo aquilo que você, Anita, escreveu acima. A roda é orgânica. Nos faz bem e é necessária para nosso viver.
    Lindos os vídeos. Ainda bem que você trouxe isso de volta. O momento, como todos, exige essa mentalidade. Isso deve ser mais divulgado. Vou repassar! Abraços

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    1. Obrigada, querida. Essa sua vivência, com certeza, marcou o que você é – aberta, acolhedora, presente. Não há ausências, na roda. Muito obrigada pelo lindo depoimento... beijos

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  8. Não conhecia. Fiquei impressionada e curiosa. Ninguém pode viver sozinho. Só com o outro nos completamos.

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    1. Exatamente . Quando será que iremos compreender essa verdade tão antiga e tão presente? Abraços

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