quarta-feira, 18 de abril de 2018

Ecos Literários | Incômodo conto


Há alguns anos, conheci a varginhense Cyntia Beltrão, desde seus tempos de jovem estudante, quando nos reuníamos para estudar as obras de Allan Kardec, codificador da doutrina espírita. Era sempre das mais atentas e ativas participantes do grupo, com opiniões firmes, corajosas que denotavam perspicácia, um atilado senso de observação e raciocínio rápido, muito rápido. Não deu outra. A cidade ficou pequena demais para ela. Mudou-se para BH, fez-se psicóloga, feminista, escritora, mãe e ativista pelos direitos dos autistas, devido a circunstâncias da  vida.  

Seu primeiro trabalho editorial é um motivo para celebrar as novas e promissoras vozes da nossa literatura. Incômodo Conto traz crônicas do cotidiano com uma boa dose de realismo fantástico. Seus escritos trazem mulheres fortes em atitudes comezinhas, a princípio, como gostar de ler ou de tomar café, trabalhar.... Despertam interesse, fazem rir e depois causam estranheza; aos poucos, incomodam, apertam, questionam e constrangem o leitor. Uma coisa de cada vez; ou tudo ao mesmo tempo. Murilo Rubião teria gostado muito de seus contos, tenho certeza.  Aliás, acho que ele foi uma de suas inspirações mais fortes, como também devem ter sido Gabriel Garcia Marques, Kafka e outros mais.

Mas por que escritora?  Cyntia sempre escreveu, mas resolveu publicar porque não sabe dançar tango. É o que diz o ótimo texto da orelha da contracapa... Perfeito. Não se pode querer tudo, quem escreve com aquela facilidade, com aquele domínio da linguagem, das ideias e das palavras não pode querer dançar tango... Aí, convenhamos, já seria covardia.

Dentre todos eles – sim, li o livro todo, porque, simplesmente, não consigo expressar alguma opinião sobre um texto ou livro sem lê-lo de cabo a rabo –, o conto que mais me tocou talvez seja o menos fantástico deles. Intitula-se Lama e narra o drama vivido por uma cadelinha em recente e trágica calamidade ecológica ocorrida nas terras mineiras. Dessas tragédias estupidamente reais, detestáveis, sofridas e absurdas, mas que ainda permanecem impunes, sem solução e sem penalizar os responsáveis.  Vários outros contos me instigaram, uns mais, outros menos, mas Lama me deixou sem fala e me mostrou a imensa capacidade da nossa nova escritora. 

Parabéns Cyntia! Que venham outras crônicas e outros contos, incômodos ou não, mas que venham certeiros.

Incômodo conto
Cyntia Beltrão
Belo Horizonte: Quintal Edições, 2017. 
www.quintaledicoes.com.br 
Compre  aqui   

2 comentários:

  1. Eu, como mãe da escritora seria óbvio elogiar o livro de contos. Mas vindo de você, sei que os comentários foram sinceros e verdadeiros. Fiquei muito emocionada quando li. Agradeço muito. Beijão

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  2. Cyntia é brilhante, não precisa agradecer. E que bom que vc me conhece tão bem! Vida Longa à nova escritora varginhense! bjs
    Anita

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