Mobiliário
urbano é o conjunto de
elementos que ajudam na ambientação, organização e funcionalidade das cidades: pontos de ônibus, quiosques, bancos,
sanitários públicos, floreiras, lixeiras, placas de sinalização e de ruas, bebedouros, apoio para bicicletas, postes de iluminação, corrimãos, grelhas para árvores, balizadores, obras de arte, estruturas para
sombreamento etc. Na foto ao lado, bancos feitos pela marcenaria municipal de Sinop, MT, com madeira apreendida pelo Ibama (aqui).
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Respeito ao cidadão. Coimbra, Portugal. Foto: Anita Di Marco |
Enfim, o conceito engloba todos os elementos construídos e dispostos na área urbana, responsáveis por tornar uma cidade mais agradável, funcional e convidativa. Como sempre disse e continuo dizendo, a cidade é nossa casa maior e, portanto, precisa
e merece ser tratada com carinho e cuidado. O
objetivo é garantir mais segurança, conforto e bem-estar a todos, criando ambientes prazerosos, seguros, confortáveis, cheios de vida e atrativos. Jamais impedir ou dificultar a passagem dos pedestres, gerar situações de
perigo, dificultar a visão, diminuir a largura da calçada etc... Segurança, por exemplo, é item essencial, mas se os moradores não frequentam ruas, praças e espaços públicos da cidade,
como garantir segurança em um lugar deserto? Por outro lado, como frequentar espaços sujos, feios, mal iluminados, sem conforto nem segurança para o deslocamento e permanência do cidadão?
Por isso, Jane Jacobs (1916-2006), jornalista americana, escritora e grande batalhadora pela construção de cidades mais humanas, em seu clássico livro Morte
e Vida das Grandes Cidades (1961), já falava a favor da humanização das áreas urbanas, buscando reverter o processo de criar cidades que esqueciam o indivíduo e privilegiavam o automóvel. Ressaltava que a teia de relações criada entre os membros de uma mesma comunidade ou bairro e
a movimentação constante de pessoas nos espaços públicos são elementos essenciais para uma vida segura e pulsante nas cidades.
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Jane Jacobs. |
Jacobs considerava moradores e usuários como os olhos da rua que, com sua presença ativa nos espaços públicos e ruas, fiscalizavam esses espaços e garantiam a segurança. Defendia ideias simples e inovadoras na época, como a
valorização do patrimônio cultural, a mistura de usos, o
adensamento equilibrado e o cuidado com pedestres e espaços públicos. São ideias que, a cada dia, têm
mais e mais defensores. A segurança, por exemplo, passa a ser consequência natural nos espaços que favorecem a permanência e a movimentação de pessoas, pois elas se sentem convidadas a vivenciar a cidade, sentem-se parte afetiva, efetiva e responsável pela comunidade. Quanto mais
espaços agradáveis uma cidade tem, quanto mais respeito o poder público demonstra à sua população, mais seguros e vibrantes serão seus espaços, porque a população se apropria deles como seus. E, todos sabemos, quem ama cuida.
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Tragédia no Mar, bronze patinado, 2005 (aqui). Obra do escultor
José João de Brito. Matosinhos, Porto, Portugal. Foto: Anita Di Marco |
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Para começar a recuperar o sentido do urbano e do
encontro nas cidades, é preciso sair dos guetos e deixar de esconder-se atrás
de muros e cercas; é preciso humanizar o espaço público, repensar o
projeto de praças, espaços e equipamentos para possibilitar a arte do encontro. É preciso pensar na estética, sim, porque todos valorizam a beleza e sentem prazer em frequentar espaços
agradáveis. As peças do mobiliário urbano, portanto, devem abrigar-se sob um projeto conceitual global que contemple a cidade como um todo. Se vistas e pensadas isoladamente, o resultado parecerá desconexo e, no mínimo, estranho, afastando os usuários. Devem ser peças bem projetadas, resistentes, criativas, com certa
uniformidade para garantir acessibilidade, conforto físico e visual, segurança
e clareza de informações.
Em muitas cidades, no entanto, o bom senso parece
estar de férias, longas férias, se é que algum dia existiu. Calçadas estreitas, escuras e esburacadas, com
postes, placas de rua e lixeiras que atravancam o ir e vir do cidadão (ver aqui). Nas praças,
bancos danificados, lixeiras destruídas ou mal resolvidas, canteiros sem manutenção, painéis informativos fechando
o horizonte. Nas vias públicas, enormes placas comerciais pensam disputar a
atenção dos clientes, mas, na verdade, criam uma horrível e confusa paisagem
urbana. É tão mais agradável fazer compras a céu aberto, em lojas com placas
que não aviltem nem obstruam nosso olhar...
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Sevilha. Espaço público enriquecido. Foto: Anita Di Marco |
Decisões simples e criativas podem criar situações inusitadas e agradáveis, locais que atraiam o olhar e convidem o indivíduo a permanecer; espaços nos quais as pessoas tenham prazer em
circular. No mundo todo, há soluções fantásticas.
Um deles é a Plaza de la Encarnación, em Sevilha, na Espanha, com a estrutura chamada Metropol Parasol, ou Las Setas de Sevilla (2005-11). Sobre seis pilares, a estrutura de madeira cobre a praça a 26 metros de altura, protege e convida as pessoas a caminharem sob e sobre ela em suas rampas sinuosas, de onde se tem uma bela vista de 360 graus da cidade. O conjunto abriga ainda museu, ruínas arqueológicas, centro de eventos e lojinha. Projeto do arquiteto alemão
Jürgen Mayer-Hermann, resultado de concurso arquitetônico, a intervenção cria referências, orienta, protege e enriquece aquele espaço absolutamente vibrante, unindo tradição à contemporaneidade.
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Av. Paulista, anos 1970. Imagem: divulgação |
No Brasil, várias cidades buscaram adotar tais práticas. Dentre elas, destaque para o projeto pioneiro Nova Paulista, da década de 1970 em SPaulo. Projeto dos arquitetos João Carlos Cauduro e Ludovico Martino (design gráfico, comunicação visual e mobiliário urbano) e Rosa Kliass (paisagismo), a intervenção mudou a face da Av. Paulista. Infelizmente, o projeto foi descontinuado e a ideia de unidade estética se perdeu.
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Projeto Nova paulista. Imagem: https://adplog.wordpress.com/2012/02/22/mobiliario-da-paulista/ |
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Parklet. Cascavel:https://www.jornaldooeste.com.br |
Nessa busca por harmonizar o mobiliário à cidade, outras cidades não ficaram atrás e, na década de 1990, por exemplo, o Rio de Janeiro criou um manual para orientar a implantação do mobiliário urbano. Mais recentemente, os parklets, cujo conceito surgiu em 2005 em San Francisco, representam outra possibilidade de criar áreas de convívio utilizando o espaço de uma ou duas vagas do estacionamento para veículos junto a calçadas. Há exemplos em inúmeras cidades brasileiras, nem sempre com bons resultados práticos e estéticos.
Os exemplos poderiam ser muito mais numerosos, mas não se trata aqui de imitar soluções ou espaços, apenas de alertar para que a população cobre vontade política dos homens públicos e que estes deem liberdade de ação para nossos criativos urbanistas. Basta aprender a olhar para as nossas cidades; e também educação, que nunca é demais. Afinal, retomando uma frase absolutamente verdadeira, a cidade é nossa casa maior. Todos somos responsáveis por ela, sem exceção, mas em maior grau os homens públicos, já que receberam nosso voto para transformarem concretamente e para melhor a vida dos cidadãos.
Referências:
https://adplog.wordpress.com/2012/02/22/mobiliario-da-paulista/
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