quinta-feira, 5 de agosto de 2021

Ecos Culturais | Gentilezas Urbanas

No início dos anos 2000, Eneida Carvalho Ferraz e eu, ambas arquitetas da FAU-USP, mas formadas em anos diferentes, éramos conselheiras do Conselho do Patrimônio Histórico e Cultural de Varginha - CODEPAC. Nossas falas se atropelavam tal o ritmo, a velocidade e a concordância de nossos pensamentos. Talvez por virmos da mesma escola. Ativíssimas, queríamos abarcar o mundo, discutir, propor, produzir, agitar, mas nem sempre conseguíamos. Nosso  objetivo (dentro e fora do Conselho) era divulgar e preservar os bens tombados da cidade, educar e conscientizar a população em geral sobre a importância de preservar o patrimônio cultural, material ou imaterial, para compor a identidade de um grupo, uma sociedade, uma nação.

Um de nossos projetos, a exposição itinerante Nosso Patrimônio vai às Escolas (2002), foi aceito, abraçado pelo grupo e executado. Anos depois, o projeto recebeu o prêmio Gentileza Urbana 2011 quando foi apresentado no 3º Fórum Mestres Conselheiros, em Belo Horizonte. O objetivo do prêmio, instituído pelo Instituto de Arquitetos do Brasil - MG em 1993, é incentivar e premiar práticas cidadãs para construir uma cidade mais gentil e melhor para todos. 

Pensamos, concebemos, definimos e realizamos cada passo do projeto que atendia aos pressupostos: por que expor, o que expor, como expor e onde expor.

Eneida, numa das montagens.

Por que expor | A justificativa: divulgar os bens tombados do município de Varginha e, dessa forma despertar o interesse, sobretudo dos jovens, sobre o nosso patrimônio cultural, o sentido de cidadania e a corresponsabilidade de todos em sua proteção.

O que expor | O conteúdo: conceitos teóricos sobre o tema da preservação do patrimônio, textos e fotos sobre os bens em questão, provenientes do acervo da Coordenadoria do Patrimônio Cultural - COPAC.

Como expor | A metodologia: 1- O problema: nem todos visitam museus ou exposições, seja por falta de oportunidade, hábito ou conhecimento.  2- A solução: uma mostra itinerante-se os alunos não vão até a exposição, a exposição vai até eles.

Onde expor |Os espaços: escolas públicas da cidade, onde a mostra permaneceria por uma semana.

Respondidos esses pressupostos, partimos para pensar como materializar a exposição.

O suporte: projetamos um painel dobrável de plástico transparente, de 1,80 x 0,60 m, subdividido em três envelopes plásticos que acomodariam o material produzido pela Coordenadoria Técnica do Patrimônio Cultural - COPAC. Conseguimos o apoio de uma empresa de plásticos da cidade, a Pry-Toy que generosamente, por meio de seu diretor Humberto Telles, executou o projeto dos painéis.  

A expografia: adaptável a vários ambientes, os painéis (10 no total) eram suspensos por fios de nylon e ligados individualmente aos suportes disponíveis em cada escola – vergas superiores de janelas, vigas, caibros do telhado; na parte inferior, os fios eram fixados a algum elemento pesado do local – blocos de concreto, em geral, ou no próprio piso, para evitar a movimentação e a rotação do painel:  

Inauguração: Raquel Silva (Secr. Educação, Rossana Ippólito (Conselheira) e Mauro T.Teixeira (Prefeito).

A logística era genial (e primária), típica de entusiastas. Toda segunda-feira cedo, Eneida e eu íamos até a escola X, desmontávamos a exposição, dobrávamos cada painel em três (havia uma costura para isso), carregávamos o carro (o meu ou o dela) com os os painéis, dirigíamos até a a escola Y e montávamos tudo de novo. Em seguida, havia uma “inauguração” oficial, ou seja, falávamos, aos professores e alunos reunidos, sobre o tema e o objetivo da exposição. Dali a uma semana tudo recomeçava. Em cada escola, havia um grupo de alunos/monitores da exposição.  

Na semana em que a exposição estava montada, os professores daquela unidade escolar trabalhavam o tema nos diversos conteúdos curriculares. Registre-se aqui nosso agradecimento à Secretaria Municipal de Educação e aos professores que acataram nossa ideia. Os demais membros do Conselho e da COPAC, a quem também agradecemos, ajudaram na seleção de material e distribuição das fotos e textos nos envelopes. A epopeia durou quatro meses. Foi um intenso trabalho de formiguinha, mas que nos trouxe muito prazer e retorno.

Em tempo, todo conselheiro era voluntário. Tudo que foi feito foi pelo bem da cidade e por acreditarmos no que fazíamos. Eneida e eu continuamos até hoje – ela em são Paulo, eu em Varginha – sempre discutindo e propondo ações sobre temas ligados à arquitetura, ao patrimônio, à cultura e à vida. Obrigada, Eneida, pela parceria de tanto tempo.

15 comentários:

  1. Nossa, Anita! Quanta gentileza de sua parte! Muito obrigada!
    Foi um trabalho que nos deu muita alegria e satisfação em poder contribuir para transmitir às crianças (e a seus pais) um sentimento de identidade com nossa terra.


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  2. Lindo saber desta iniciativa e da significativa realização de vocês, devidamente ilustrada e tão bem relatada aqui!! Que orgulho…

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  3. Oi, querida. Obrigada. Vc sabe como o entusiasmo conta,né? Obrigada mesmo por comentar. Sei da sua vida intensa.. bjs grande

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  4. Quanta beleza nesse trabalho! Parabéns as duas por fazerem tanto pela cultura.

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    1. Foi um processo muito legal. Obrigada, querida. Bjs

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    2. Parabéns Anitinha,Eneida pelo belo trabalho realizado. Isto para nossa cidade é e será sempre essencial. Bebel

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  5. Maravilha. Precisamos de ações assim para construir uma sociedade melhor e mais plural.
    Parabens.
    Carlos SA

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    1. Obrigada, Carlos. A gente vai tentando, né? A cada dia .. é da nossa natureza. Bjs

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  6. Boa noite, Anita,
    Essa postagem parece soar como memória saudosa. Não há alguma possibilidade de recomeçar essa atividade? O tema continua atual e a cidade em que você reside seria muito beneficiada...
    Belo trabalho, de fato. Merece um recomeço.

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  7. Oi, Marta. Na verdade, continuamos agora como formiguinhas, um dia de cada vez e sempre que possível. Você sabe, não é fácil, mas continuamos tentando... tudo em prol da educação e da cultura. Obrigada, abraços

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  8. Gostei demais desse resgate da história. Parabéns, Anita!

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  9. Trabalho lindo e necessário a comunidade. Seria tão bom se tivesse continuidade. Meu coração dói qdo vejo um imóvel antigo completamente desfigurado

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    1. Pois é, para isso é preciso investir na educação integral, né? Obrigada . Bjs

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