quinta-feira, 27 de janeiro de 2022

Ecos Culturais | Bibliotecas são essenciais

Imagem. Diário do Centro do Mundo. Divulgação
Desde criança, leio. Li e leio muito. De histórias de fadas a Monteiro Lobato; dos clássicos da literatura aos didáticos; dos livros de arquitetura aos de yoga, espiritualidade e tradução. Para mim ler é essencial. Acredito que o seja para todos, para o desenvolvimento da fala, da escrita, do pensamento crítico. Para criar leitores ávidos e pensantes. Assim, educação, boas escolas, estímulo à leitura e bibliotecas públicas de qualidade são serviços obrigatórios para qualquer cidade e para o desenvolvimento da cidadania.   
 
Biblioteca Nacional (1810), RJ, a mais antiga do país.
Além disso, repositório imenso do conhecimento humano, as bibliotecas públicas são essenciais para permitir que tenham acesso aos livros aqueles sem condições de adquiri-los. Daí, a necessidade de verbas e profissionais qualificados e criteriosos para gerir e manter as bibliotecas atuantes e atualizadas, não só com clássicos e obras de referência, mas também com livros das novas gerações de autores.
 
É através da leitura e da Literatura que (re)conhecemos o outro, o diferente e o distante com suas mazelas; muitas vezes, primeiro nos livros e só depois (nem sempre), na vida real; que conhecemos nosso país com sua riqueza, diversidade, tropeços e triunfos, e o mundo com suas fronteiras visíveis e invisíveis... Em seus romances, poemas, biografias ou diários, autores nos falam de história, geografia, etnias, luta, magia, ancestralidade, servidão, ditadura, esperança, pactos, liberdade, conquistas, utopias, amor, alegrias e tristezas... 
 
Biblioteca Brasiliana, USP- SP. Foto: Divulgação.
 
Se os livros de história, em geral, falam de fatos vistos apenas pelos olhos dos vencedores, quase nunca dos perdedores, a  Literatura consegue questionar, colocar o dedo na ferida e mostrar a real dimensão social e histórica de uma dada situação. Tem o poder de nos despertar pois, enquanto lemos, somos levados a conhecer lugares jamais visitados, a viver a vida de personagens até então desconhecidos, a viver situações inusitadas. A Literatura tem o poder de nos causar indignação, mas também grandes emoções, arrebatamentos e transformações. 
Sempre é tempo de reivindicar do poder público mais incentivos à leitura, à educação e à criação de bibliotecas públicas de qualidade!

Referências

https://www.diariodocentrodomundo.com.br/conheca-as-bibliotecas-mais-populares-do-brasil/

https://redeglobo.globo.com/sp/tvtribuna/Camera-Educacao/noticia/conheca-as-10-bibliotecas-mais-bonitas-do-brasil.ghtml 

https://brasilescola.uol.com.br/sociologia/por-que-as-bibliotecas-estao-ociosas.htm

quarta-feira, 19 de janeiro de 2022

Ecos Humanos | Ter o que dizer

Certa vez li uma frase do escritor tradutor, linguista e semiólogo italiano, Umberto Eco (1932-2016), que, na época, me pareceu um tanto agressiva. Hoje, não poderia estar mais de acordo com o seu pensamento. Em uma entrevista ao jornal La Stampa, Eco disse que as mídias sociais deram voz a uma legião de imbecis (aqui).

 I social media danno diritto di parola a legioni di imbecilli che prima parlavano solo al bar dopo un bicchiere di vino, senza danneggiare la collettività. Venivano subito messi a tacere, mentre ora hanno lo stesso diritto di parola di un Premio Nobel. È l’invasione degli imbecilli.             

[As redes sociais dão o direito de falar a uma legião de imbecis que antes só falavam na mesa de bar depois de uma taça de vinho, sem prejudicar a coletividade. Eram rapidamente silenciados, mas agora têm o mesmo direito de falar que um prêmio Nobel. É a invasão dos imbecis.] Umberto Eco ao jornal La Stampa, 11 junho 2015.

Sim, porque manifestar sua "opinião", em frases que começam com o famoso "eu acho" atrás da tela de um computador é fácil. Difícil é defender com argumentos sólidos o que fundamentou essas opiniões. Sabemos que uma imensa quantidade dos comentários das redes sociais carece de verificação da veracidade da informação, de análise isenta, dimensão histórica, pensamento crítico, visão abrangente, ética e por aí vai...

A esse respeito recomendo o excelente artigo de Elenira Vilela, professora no Instituto Federal de Santa Catarina e líder sindical. O artigo já começa com um questionamento: — Você precisa falar sobre tudo? Você tem criticado o opressor mais do que critica as tentativas de resistência e enfrentamento dos oprimidos?

Pronto. A pergunta já mexe com nossos brios, mas refiro-me não só a questões políticas (trágicas, por sinal), mas a qualquer assunto. Acho que todo mundo conhece alguém que não consegue ouvir algo sem emitir uma opinião a respeito, concordam? E o pior é quando esse alguém repete e divulga notícias enganosas. Quando eu pergunto: — Onde você obteve essa informação? A resposta é: — No Instagram, no WhatsApp ou no FB. Convenhamos, não dá para levar isso a sério, né? O fato é que esse comportamento leva a diversas formas de incompreensões, incitamento a violência e criação de alvos fáceis nessa era de pós-verdades.   

Em seu artigo, Elenira Vilela recorda que aquele que quer opinar sobre movimentos sociais, por exemplo, deve perguntar-se se tem direito, legitimidade e condições de falar sobre aquele tema e com qual objetivo. Diz ela (e eu concordo) que além do compromisso crítico e analítico que qualquer palavra escrita ou falada exige, falta-nos o compromisso ético.

O mais triste talvez seja perceber que, mesmo com uma pandemia que já levou dois anos da nossa vida, a ficha ainda não caiu para muitos que acham que tudo voltará ao “normal”. Que normal? Pois foi o “normal” que levou a isso tudo. Será que ainda não ficou claro? Já passou da hora de mudar e mudar significa, para começar, reexaminar-se, analisar-se, avaliar seu comportamento com isenção e transformar-se.  

Vários autores já falaram sobre isso: Márcia Tiburi, Leandro Karnal, Mário Sérgio Cortella, Leonardo Boff, Frei Betto, entre muitos outros. Do meu lado, sugiro a leitura de outro post aqui no blog: a resenha de Gramática da Manipulação, livro de Letícia Sallorenzo, jornalista e mestre em Linguística pela Universidade de Brasília. No livro ela analisou como a grande mídia dá as notícias. O leitor comum não percebe essas sutilezas e, de tanto ler as mesmas coisas do mesmo jeito, na mesma ordem e com a mesma ênfase, acaba por aceitar aquela versão dos fatos como verdade. E a replicar o que leu, sem questionar, sem checar a fonte, sem uma leitura mais profunda e crítica, criando uma linha de pensamento paralela, num processo que exige mais reflexão, mais empatia e mais cuidado com a dor alheia.

Enfim, é bom lembrar que existe vida fora das redes sociais e que a linguagem das redes também pode ser (muito) violenta, preconceituosa e mentirosa. Conclusão: é preciso ler com um pé atrás, buscar outras fontes, analisar outros dados históricos e fazer as contas e as conexões devidas, pois ler é muito mais do que entender o que está escrito. 

Antes de escrever e publicar sua opinião sobre qualquer coisa, vale avaliar: tenho certeza absoluta do que vou dizer, tenho legitimidade para isso? E, mais, humildemente vale perguntar-se por que sua opinião interessaria aos demais leitores. Termino com uma frase singular do texto de Elenira Vilela:

Enfim, a sabedoria popular vive nos lembrando que temos dois ouvidos e uma boca, que a palavra é de prata e o silêncio é de ouro. Se, na maior parte das vezes, a única atitude que te passa pela cabeça é opinar sem reflexão, talvez calar seja a única opção realmente ética.

 

Referências:

https://www.viomundo.com.br/voce-escreve/elenira-vilela-falta-etica-na-publicizacao-de-opinioes-de-muita-gente.html
https://anitadimarco.blogspot.com/2019/04/ecos-literarios-gramatica-da-manipulacao.html
https://www.lastampa.it/cultura/2015/06/11/news/umberto-eco-con-i-social-parola-a-legioni-di-imbecilli-1.35250428