quarta-feira, 27 de abril de 2022

Ecos Humanos | Das utopias

A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos, e o horizonte corre 10 passos. Por mais que eu caminho, jamais a alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar. (Fernando Birri, citado por Eduardo Galeano)

Se as coisas são inatingíveis. . . ora! Não é motivo para não querê-las. . .
Que tristes os caminhos, se não fora a mágica presença das estrelas!

(Mário Quintana)

Utopia é tema primordial e frequente não só em Galeano, Birri ou Mário Quintana. Também falam sobre o tema Leonardo Boff, Frei Betto, Mário Sérgio Cortella, além de filósofos, autores, mestres espirituais, professores e tantos outros. Falar sobre utopia é falar sobre esperança, autoconhecimento, resiliência, superação e transformação.
Em seu livro A República” (Politeia), Platão fala da sociedade ideal e justa na cidade de kallipolis. Lá, a aristocracia era ditada pelo conhecimento, daí a cidade ser governada por reis/filósofos. Por serem dedicados à razão, esses governantes saberiam como controlar seus impulsos e emoções para governar a cidade de forma justa. Partia-se do princípio que o desconhecimento (ou ignorância) pode levar a injustiças. Assim, a justiça é o eixo condutor do livro que também aborda temas como educação, política, segurança, imortalidade da alma etc. É em A República que encontramos o conhecido Mito da Caverna, tema sempre atual e que logo será aqui publicado. 

Outro livro, outra época, mas o mesmo tema. Utopia  Desta vez, do filósofo britânico Thomas Morus ou Thomas More (1478-1535). Em 1516 Morus publicou Utopia, nome de uma ilha. A propósito, u significa não e topos, lugar, ou seja, não lugar, lugar inexistente. O livro critica a sociedade da época e, em contrapartida, descreve uma sociedade alternativa, organizada de forma completamente diferente daquela da época de Morus. Na Ilha Utopia, o foco principal repousava no coletivo e na importância de valorizar o bem comum; não havia propriedade privada, todos colaboravam com todos e intolerância religiosa e fanatismo eram punidos com exílio. A fé, portanto, era vista como consequência da razão (sempre a razão) e um instrumento fundamental para o exercício e a aplicação da justiça. Utopia mesmo, não? 

A propósito de aristocracias [do grego aristos (melhor) e kratos (poder), "governo dos melhores"], Allan Kardec, codificador da Doutrina Espírita e pseudônimo do pensador, filósofo e professor Hyppolyte Léon Denizard Rivail (1804-1869), em seu livro “Obras Póstumas” (1890) fala dos quatro tipos de aristocracia  que dominaram o mundo, até então: patriarcal, da força bruta, do nascimento e do dinheiro. Dizia Kardec que chegaria o dia em que o mundo seria governado pelo quinto tipo de aristocracia, vinda daqueles que manifestavam sua força moral, unindo inteligência e moralidade. Eles constituiriam o que Kardec chamava de a aristocracia intelecto-moral, cujas ações visariam apenas ao bem comum, ao bem de todos, do grupo, nunca para satisfazer  interesses pessoais. Só a partir daí é que poderia haver a “resolução dos problemas sociais, políticos, econômicos, religiosos e culturais” da humanidade. 

Depois dessas visões utópicas e de aristocracia humana, só resta uma pergunta que cada um deve fazer a si próprio: a que distância estou desse último tipo de aristocracia nada utópica? 

Referências

Chauí, Marilena. A República, Platão. Introdução à História da Filosofia: dos pré-socráticos a Aristóteles.

KARDEC, Allan. Obras Póstumas. Tradução Salvador Gentil. Revisão Elias Barbosa. 1 ed. Araras/SP: IDE, 1993

5 comentários:

  1. Voce pode dizer que eu sou um sonhador/ mas eu não sou o unico/ junte-se a nós e o mundo sera um só.
    bjs.
    Carlos Lennon SA.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Somos dois, meu amigo, três contando o mineiro... grande abraço

      Excluir
  2. A utopia é minha naturalidade e nacionalidade nestes tempos em que a noção do outro parece ter virado cinzas. Lindo e profundo texto, Anita.

    ResponderExcluir
  3. Não muito longe, espero!!
    As outras quatro vão ficando pra trás, mas tenho ressalvas com quem se apresenta sempre como um exemplo de moralidade, muito passional e que fica exaltando a sua própria elevação moral. Desconfio!

    Seus textos sempre levantando ótimos tópicos para debate, tia Anita! ;)

    beijão!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Daniel, veja, não falo de moralismo, ou do falso moralismo cínico e hipócrita que vemos por aí, mas de Moral com M maiúsculo, aquela de agir com o outro como vc gostaria que agissem com você! Isso é o que te dá autoridade moral. Obrigada por comentar, beijos

      Excluir