sexta-feira, 12 de agosto de 2022

Ecos Humanos | Arquitetura com "A", não aparência

Minha casa. Desenho da Maitê C.M., 7 anos
Ainda jovenzinha, com uns 13-14 anos, eu já falava que queria fazer algo ligado à arquitetura. Mas  para mim,
arquitetura sempre foi mais que interiores ou projetar casas, prédios, e sim, pensar o local que acolhe e integra tudo isso, a cidade. Portanto, mais do que arquitetura, queria lidar com urbanismo, só que ainda não sabia. Desenhava paisagens típicas de cidades: largos, ruas, praças, parques, casas e rios. Ia do geral ao particular e, por fim, eu me detinha na minha casa, como Maitê no desenho ao lado, e na divisão interna das casas, mas já tinha a noção de que o entorno, o todo era essencial. 
 
Depois, já na faculdade de Arquitetura, descobri que meu foco era mesmo a cidade, onde poderia juntar conceitos que trazia de casa com os que aprendia na escola: solidariedade, verdade, bem-estar individual e coletivo, qualidade de vida, sustentabilidade, responsabilidade social, readaptação mais do que construção, respeito à natureza, ao entorno e ao patrimônio. Via a cidade como um todo: se um setor estava carente, insatisfatório ou decadente, o todo, ou seja, a cidade também estava. Era preciso harmonizar o todo. 
 
A agradável cidade de Goiás. Foto: Anita Di Marco
Sustentabilidade, por exemplo. Sempre associei esse conceito ao meio ambiente, claro, mas também à praticidade. Em outras palavras, talvez haja excesso de espaço em muitas de nossas moradias. Quando penso em moradia, penso em conforto térmico, dignidade, segurança, mas também na parte prática, como tempo, recursos financeiros e materiais a serem gastos na limpeza, organização, conservação e manutenção da casa. E, sobretudo, no irretocável "less is more", em termos mais amplos de sustentabilidade...
 
 
Isso sem falar no custo dos serviços públicos, porque teoricamente, quanto mais espraiada for a cidade, quanto mais distantes do Centro forem os novos bairros, mais dispendioso será para o serviço público levar serviços até lá. Nesse caso, criam-se os bairros-dormitório com aquele amontoado de casas e nada mais, nada perto, nenhum serviço essencial para atender aqueles moradores. É aí entra a sustentabilidade, de novo, porque em locais mais adensados, tudo é mais mais viável, vibrante,  sustentável e democrático, já que as áreas habitacionais estão onde estão os serviços, aos quais todos teriam acesso facilitado. O mesmo vale para readaptação ou renovação dos imóveis em lugar de novas construções. Se é possível, recuperar, readaptar ou renovar por que construir o novo? Onde fica a sustentabilidade, o desperdício de recursos humanos, materiais e o tempo gasto? 
 
São Paulo.Foto: Anita Di Marco
Enfim, são conceitos que devem estar na mesa de discussão (ou na prancheta dos arquitetos) o tempo todo. Conceitos como respeito ao entorno e responsabilidade social caminham juntos com sustentabilidade. Não adianta aplaudir medidas teóricas, fazer discursos tocantes e, na hora H, mudar tudo, burlar leis e esbanjar recursos e espaços, privilegiando o individualismo, como diria Caetano, a "grana que ergue e destrói coisas belas" e negando a sustentabilidade geral das cidades, de seus habitantes e do planeta... 
Como tudo na vida, coerência entre o pensar e o fazer é o que parece estar faltando. 

12 comentários:

  1. Ahh, se todos pensassem e agissem assim como seria bom!! Sucesso amiga!

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  2. Canberra é massa nesse sentido: a cidade é composta por vários núcleos regionais. As crianças estudam nas escolas do bairro.

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    1. Joana, querida. Vc não assinou... Mas essa é a tônica, fazer tudo no mesmo bairro, por isso viva Camberra e as cidades que já entenderam isso e colocam o bem-estar de toda a população em primeiro lugar. Beijos e obrigada

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    2. Gostei muito, Anta!
      Sou a Silvia Artacho

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    3. Oi, Silvia, obrigada por comentar, querida ...

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  3. Análise muito lúcida, Anita. Outro ponto crítico: o pobre trabalha no centro ( cada vez mais despovoado) e mora na periferia, onde faltam escola, posto de saúde, lazer...viva Villanova Artigas.

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    1. Imagino que seja você, José Marcelino. Pois é, Artigas era do time dos arquitetos que pensavam além..... abraços

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  4. Muito bom o texto! O bom será o dia que em todos os bairros tiverem tudo perto.

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  5. No Brasil poucos políticos levam em conta esses conceitos nas administrações municipais. Uma pena!
    Maria Inês

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  6. Gostei demais! Análise pontual e necessária. A parte sobre os "bairros-dormitório" está ótima e super atual.

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