segunda-feira, 13 de junho de 2016

Memória & Vida | Como Cusco me levou a Roma!

Como volta e meia alguém me pergunta, vou contar aqui como fui parar na Itália, terra de meus avós paternos, Francesco De (ou Di) Marco e Rosária Marino. 
Bom, durante minha graduação em Arquitetura na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP), minha intenção era fazer mestrado na Inglaterra e desenvolver uma pesquisa ligada à história do urbanismo, com as novas propostas urbanas, as cidades novas, a relação entre os espaços públicos e privados, a morfologia e as tipologias urbanas. Sempre tive (e ainda tenho) interesse em ambientes maiores do que o edifício em si, ou o projeto de um único edifício. Não que o projeto não interfira no desenho da cidade, muito pelo contrário. O projeto é fundamental porque define a cidade, mas o espaço urbano vem antes: a rua, a quadra, os espaços públicos, os largos, as praças, as esquinas e por aí vai. Tudo está interligado.
Desde sempre, gosto mesmo é da cidade, desse universo diversificado e rico, da casa maior de todos nós. A cidade é o espaço por excelência das trocas e das possibilidades, ambiente onde o homem pode viver, se desenvolver, se relacionar, cuidar e compartilhar um mesmo espaço urbano agradável, cheio de vida e que pode ser aprimorado. No entanto, mesmo antes de me formar, acabei me envolvendo com outra área que também me atraía - patrimônio histórico e cultural.  
 
Plaza Mayor, Cusco. Foto: Júlia Di Marco Alves
No final de 1981, fiz uma linda viagem à Bolívia, ao Peru e ao Norte do Brasil (em outra oportunidade falo sobre aquela viagem), conheci Cusco e fiquei apaixonada pela cidade. Conversando sobre a viagem, descobri, por uma colega arquiteta (SPB) do Departamento do Patrimônio Histórico da Prefeitura de SP, que havia lá um curso ligado à preservação do patrimônio promovido pelo International Center for the Conservation and Restoration of Cultural Property-Iccrom, entidade ligada à UNESCO, cuja sede era em Roma. Resolvi, então, buscar mais informações para fazer aquela especialização e, quem sabe, voltar e morar, por um tempo, naquele belíssimo espaço urbano.
Nesse meio tempo, a querida amiga e colega de trabalho,  arquiteta Maria Luiza Dutra, terminara o mesmo curso, só que em Roma. Quando lhe falei sobre minha intenção de fazer o curso em Cusco, ela me perguntou: – Mas você fala inglês e italiano.... Por que não ir a Roma? De fato, seu argumento tinha toda lógica e, mais uma vez, fui buscar informações.

Como membro das Nações Unidas, o Brasil tinha direito a uma vaga. Para ser inscrito, no entanto, o interessado precisava atender a alguns pré-requisitos. Bastante disputado, o curso aceitava apenas 22 participantes do mundo todo por ano. Para ser aceito era preciso:
1- Estar no serviço público há pelo menos quatro anos, em área relacionada.
Truco. Eu já trabalhava há cinco anos, como arquiteta concursada, no Departamento do Patrimônio Histórico–DPH da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo;
2- Ser proficiente em inglês.  
Truco de novo. Já dava aulas de inglês havia seis anos;
3- Ter nível intermediário de italiano.  
Tri-Truco. Em casa, desde sempre, falava ‘mezzo’ italiano com meus avós, provenientes da região da Basilicata, perto da Calábria, mas também havia concluído o curso completo de italiano e estava tinindo;
4- Obter uma bolsa de estudos para custear a estada em Roma.
Truco, de novo e de novo! Havia pedido e conseguido a bolsa de estudos do governo italiano. 
 
Palazzo Doria Phamphilj, embaixada brasileira na Piazza Navona.
Parecia inacreditável...
Só havia um probleminha. A aceitação da minha inscrição no curso do Iccrom e a bolsa de estudos vieram antes da autorização da Prefeitura de São Paulo para minha ida. Precisava de uma licença sem vencimentos, por um ano. O prefeito da época era Reynado de Barros (gestão de 1979-1982) e ele, raramente, autorizava tais licenças. Entrei com um requerimento normal, dentro da burocracia do serviço público e...  não é que ele autorizou? Bem que minha mãe me dizia para ter fé porque... o que é do homem o bicho não come...

Parecia que, naquele ano de 1982, a sorte me favorecera, em todos os sentidos: eu era a candidata perfeita. Fui aceita pelo Iccrom para o curso de especialização em Architectural Conservation, ganhei a bolsa de estudos do governo italiano, complementação dessa bolsa pelo próprio Iccrom, consegui a licença sem vencimentos da Prefeitura de São Paulo e lá fui eu para a cidade eterna que, desde então - precisamente, desde outubro de 1981 - se transformou também na minha segunda casa. Sobre os amigos de lá, conto em outra ocasião. 

 Grupo do curso Architectural Conservation, turma de 1982, às margens do rio Tibre, com a bandeira do Iccrom.

9 comentários:

  1. Que bela história Anita! beijos Ligia

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  2. Que coisa maravilhosa, Parabéns!!!!!!!!!!

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  3. Que oportunidade e que boas lembranças!... bjs.

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  4. Tem uns momentos que a sorte conspira a nosso favor. E quando a gente faz por merecer, como era seu caso, acontece. Foi uma experiência maravilhosa, percebe-se. Grande abraço. Francisco (mandando a mensagem como anônimo porque não sabe assumir a identidade virtual da net).

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    1. É verdade, Francisco.
      E mesmo entrando como anônimo não se esqueça de assinar, está bem? Se vc não assina, eu fico sem saber de quem é o comentário. Obrigada pela visita. apareça sempre

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  5. muito legal e muito obrigada por compartilhar as coisas boas da vida, as nossas referências, e o preparo natural que a Vida nos proporciona e se tivermos atentos, "pegamos esta onda" , você escreve com muita leveza é lindo! Parabéns , lindo... Cidade Eterna, e é mesmo....

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