quarta-feira, 9 de março de 2022

Ecos Imateriais | Yoga como caminho

Criado há milênios, o yoga era ensinado de mestre a discípulo e, nesse convívio, o professor passava ao aprendiz ensinamentos dessa filosofia e de vida. As quatro grandes linhas ou escolas de yoga trabalham com diferentes métodos para chegar ao mesmo fim – yug, integrar o ser humano com sua essência, sua parte divina. São elas: Bhakti (devocional), Jnana (conhecimento), Karma (ação) e Raja (real). O Hatha apareceu depois como "escada" para o praticante atingir o Raja Yoga, como dizem os textos clássicos, a saber: Hatha Yoga Pradipika, Gerandha Samhita, Shiva Samhita e Goraksha Shataka.

Como escola filosófica teórica e prática, o yoga traz em seu bojo um roteiro de autoeducação, um esforço persistente para o indivíduo se conhecer e se aprimorar. No século 3 a.C. Patanjali compilou e sistematizou esse conhecimento no chamado Yoga Sutra, que é dividido em quatro partes. Na segunda, Sádhana Pada (ou o caminho da prática), ele expõe o Ashtanga Yoga (yoga de oito membros). Define o yoga como cessação dos movimentos da mente (ou meditação) e descreve as oito etapas para se alcançar esse estado. 
 
As duas primeiras trazem uma série de dez regras de conduta: cinco para facilitar o convívio em sociedade (porque ninguém vive sozinho) e cinco para o autodesenvolvimento. Com isso, pressupõe o chamado estado de presença, a atenção plena sobre os próprios atos, pensamentos e palavras. Os refreamentos (yamas), ou regras para o convívio social, propõem: não violência em todas as dimensões do ser humano (olhar, pensar, sentir, falar, agir); conduta filiada à verdade e só à verdade; não apropriação do que não lhe pertence desde a dimensão mais usual à mais sutil do termo; canalização e uso adequados de sua energia; e não acumulação ou desapego.  
As observâncias (niyamas), também em número de cinco, propõem perseguir a pureza do corpo, da mente e do espírito (no pensar, no ouvir, no falar, no sentir e no agir); contentamento e equilíbrio constantes, apesar das adversidades; disciplina e resiliência; autoestudo e estudo dos textos sagrados; e, por fim, devoção, entrega e confiança na Vida.

Cumprir esse roteiro é um caminho de vida; é trabalho duro, individual, intransferível. Ninguém aperfeiçoa o outro e ninguém se eleva em termos de espiritualidade, a não ser por si mesmo. Tudo começa com o autoconhecimento: ninguém pode tirar o cisco do olho do outro sem olhar primeiro para o seu próprio olho, e isso requer coragem, honestidade e vontade firme. No entanto, o que mais fazemos é apontar o dedo, julgar, rotular e condenar.  Em todas as tradições, porém, os mestres ressaltam que todos temos a mesma origem e o mesmo destino, ou seja, caminhamos em direção à mesma luz. As escolhas, o percurso e, portanto, o tempo de jornada é que são diferentes. Assim, cada um pode transformar-se em farol e iluminar o caminho com seus exemplos e ações. Francisco Cândido Xavier (1910—2002) dizia que a palavra convence, mas só o exemplo arrasta. Só assim, passo a passo, com consciência e perseverança, é que nascerá em nós o indivíduo novo que contribuirá para a construção de um mundo melhor. 

Além disso, vale lembrar que o yoga utiliza o corpo como ferramenta, como instrumento para se chegar à mente e, assim, muito mais que posturas estranhas, exóticas e acrobáticas, o cerne do yoga é a vivência cotidiana dos chamados yamas e niyamas, que representam o coração, a parte mais profunda e difícil do yoga, mas que nos leva à efetiva auto-observação e autotransformação na prática diária.  Como diz Marcos Rojo, conhecido professor de yoga em São Paulo,"em qualquer prática de yoga restringir-se apenas às posturas é empobrecer e reduzir drasticamente o yoga" e ainda "se minha prática e minha meditação não transformam minha ação no mundo de nada valem".  Namastê!

12 comentários:

  1. Namaste, Anita! Excelente publicação! Passei a conhecer mais profundamente as diversas modalidades de Yoga.O mundo seria diferente se conseguíssemos assumir, na prática , a filosofia yogue.

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    1. Nem me diga, Lilian. É uma filosofia belíssima, um caminho de vida mesmo, com escolhas diárias, vitórias pequenas, passo a passo, chegaremos lá. beijos e obrigada

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  2. Perfeito amiga! Que a gente consiga vivenciar o que é o yoga, nas escolhas do dia a dia. Teoria e prática juntos. Obrigada pelo texto! Muito didático!

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    1. Amém, querida! O yoga nos juntou e seguiremos juntas. Beijo grande!.

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  3. Lindo texto, Anita!Obrigada por sua sabedoria!

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  4. Muito bom Anitinha! Estamos sempre aprendendo com você. Namastê!

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  5. Aff! Estou longe de co seguir canalizar minha energia. Quem dera! Mas, vamos tentando! Pena que moramos longe, amiga.
    Obrigada por este texto lindo.

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  6. Beleza. O caminho, a verdade e a vida como diria o Mestre Nazareno. Eu que me "achei" tambem um yogue de ouvido na musica do baiano Moraes Moreira sempre procuro estar atento a qualquer ensimanento.
    Beijos
    Carlos SA

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    1. Idem, Moraes Moreira é um querido. Este é o link a música "Yogue de ouvido" que vc citou : https://www.youtube.com/watch?v=cKBjdwwJ2G4&feature=youtu.be
      Obrigada, meu amigo!

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  7. Muito bem escrito. Saber colocar a essência das ideias é brilhante. Experiências que nos colocam na consciência da união/Yoga, ou seja, na integralidade do Ser transformam a qualidade do viver. É completamente gratificante. Muito obrigada Anita, bjinhos

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  8. é um caminho trabalhoso e de dia-a-dia; momento por momento. Quisera eu chegar lá.
    Muito bom, o texto e a gigantesca filosofia de toda essa prática.

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  9. Ótimo texto. Nada como um dia após outro e um passo de cada vez

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