domingo, 11 de novembro de 2018

Ecos Urbanos | Na Península Ibérica (1/4)


Porto e Arredores 

Foi nossa primeira vez na Península Ibérica, tão ilustre, tão estudada, tão buscada por estudantes e profissionais da arte e da arquitetura. E dizem que ninguém se esquece da primeira vez... Verdade! Da nossa primeira viagem a Portugal (Porto, Guimarães e Braga; Aveiro e Coimbra; Tomar, Batalha, Alcobaça e Óbidos; Lisboa, Sintra) e Sevilha, na Espanha, vou relatar aqui um percurso que me pareceu interessante para o viajante, arquiteto ou não, que queira apreciar as belezas, a comida, os espaços, os monumentos e as cidades visitadas. As dicas para a definição do roteiro vieram de muitas pessoas, em especial das amigas Marina Massote e Teresa Santos. Obrigadinha, queridas!
Porto: limpeza, azulejos, harmonia. Foto: Anita Di Marco, 2018.
  Bem, nosso primeiro destino foi Porto, cidade caracterizada pela mescla entre tradição e modernidade e pelas referências de dois arquitetos laureados com o Prêmio Pritzker Álvaro Siza Vieira (1933), em 1992, e Eduardo Souto Moura (1952), em 2011. Nosso passeio arquitetônico começa já ao desembarcar em Porto, no aeroporto Francisco Sá Carneiro, um misto de arquitetura, luz e aço. Inaugurado em 1945, como Aeroporto de Pedras Rubras, teve sua pista aumentada nos anos 70 e, em 1990, foi a vez do terminal de passageiros, quando o aeroporto recebeu a denominação atual. As últimas obras de reforma e ampliação, a partir de 2006, ficaram a cargo do arquiteto João Carlos Ferreira Leal e o edifício passou de 16 mil para mais de 100 mil metros quadrados de área, e a altura das estruturas foi de 9,5 metros para 32 metros. 
Arredores da Casa da Música. Foto: Anita Di Marco

 Claro, como arquiteta, além das tradicionais visitas aos centros históricos, edifícios e lugares recomendados como a Livraria Lello, o Coliseu do Porto, as várias igrejas e estações, cafés e mercados, minha lista incluía obras modernas como a Casa da Música do holandês Rem Koolhaas (1944), outras de Álvaro Siza (1933), como o Museu da Fundação Serralves, a Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto – FAUP, suas obras em Leça da Palmeira e Matosinhos, e a Casa da Arquitetura, atualmente com a mostra Infinito Vão. Infelizmente, não consegui ver tudo isso, por falta de tempo, mas conheci a Casa da Música, pertinho do nosso hotel. Vi, à distância,  outra bela obra que não conhecia, o Terminal de Cruzeiros de Leixões, em Matosinhos, do arquiteto Luis Pedro Silva.  

Casa da Música, Porto. Projeto Rem Koolhaas.

Nosso hotel no Porto, Boa Vista Guest House era de pequeno porte, mas bastante acolhedor, agradável, sem excessos e com um pessoal simpático, atencioso e gentil que nos recebia com um cálice de vinho do Porto. Beleza, hein? Recomendo! Além disso, o hotel era bem localizado, próximo à estação de metrô Carolina Michaelis. A propósito, durante todo o tempo em que viajamos, caminhamos muito e utilizamos sobretudo o metrô (metro, como eles falam lá, sem acento e com a sílaba tônica no me). Ao lado do hotel, na mesma rua Boa Vista, tivemos a sorte de encontrar, no nosso primeiro dia na cidade, um espaço gentil e agradável que nos acolheu enquanto esperávamos para fazer check-in no nosso hotel. Trata-se do D'Alma e Coração, cuja proprietária, Angela Mansilha, preparou uma deliciosa refeição com pães, frios, uvas, nozes e queijos locais, mesmo fora do horário. Uma gentileza que nos encantou já desde o primeiro momento em que chegamos à cidade.    
Lateral da Igreja dos Carmelitas e seus fantásticos painéis de azulejos, 
desenhados, pintados e colocados em 1912. Foto: Anita Di Marco, 2018

Porto é uma cidade charmosa e encantadora, com belas praças, ruas e avenidas de escala agradável, espaços acolhedores e azulejos por todo lado. Aliás, subir e descer as ruas do Porto fazem parte de qualquer percurso para conhecer bem a Cidade Baixa, às margens do rio Douro, e a Cidade Alta, na região da Torre dos Clérigos.  O bom é perder-se por ali (o que é impossível em termos literais e geográficos, porque basta localizar o rio ou um dos marcos referenciais, como a torre dos Clérigos ou a Catedral e o indivíduo já sabe onde está), apreciando o rio, as áreas de pedestres, os bairros, as escadas, os bondinhos, as livrarias, os cafés, as mil igrejas como a Igreja das Almas de Santa Catarina, a de Santo Ildefonso, a antiga igreja-fortaleza Sé do Porto e seu claustro, os enormes painéis de azulejos dentro e fora de edifícios, como as próprias casas, igrejas e a Estação São Bento (com murais de autoria do artista Jorge Colaço), as ruelas medievais e amplas praças como a Praça da Liberdade, bem no centro da cidade, emoldurada por soberbos edifícios como a Câmara Municipal. 
Igreja dos Clérigos. Nave oval, branca e rosa. Foto: Anita Di Marco.
Outros edifícios a destacar são a Bolsa de Valores e seu belo salão árabe, o Mercado Bolhão, em recuperação até 2020 e funcionando em outro local durante as obras para garantir a alegria dos frequentadores, turistas ou não, e o icônico Café Majestic, glamoroso desde seu início em 1921 e que, com certeza lembra muito a charmosíssima Confeitaria Colombo, fundada em 1894 no Rio de Janeiro, com seus espelhos, pisos, luminárias, mobiliário, bancadas de mármore e vitrines. 
Porto, vista de Vila Nova de Gaia. Foto: Anita Di Marco, 2018.

Mas o maior ponto de referência da cidade é, sem dúvida, o rio Douro com suas pontes, vistas, paisagens, barcos e esplanadas. Com o metrô de superfície cruzamos a ponte Dom Luís I, estrutura metálica construída em 1886 por um discípulo do engenheiro Gustave Eiffel, construtor de certa torre francesa. Depois de apreciar a vista do Porto lá do alto, descemos pelas escadarias de Gaia, até a Ribeira. Seja do lado do Porto ou de Vila Nova de Gaia, as margens do Douro (a Ribeira), é o coração da cidade e uma deliciosa esplanada para caminhadas, uma taça de vinho ou um descanso nas pernas, sempre observando o vai e vem da multidão de turistas. Do lado de Gaia, ainda se encontram as vinícolas do principal produto da região, o vinho do Porto. As visitas guiadas às caves (visitamos a Ramos Pinto, a mais antiga), obrigatórias para qualquer cidadão minimamente interessado em vinhos, falam das origens, curiosidades e da história das vinícolas, do processo de fabricação, envelhecimento e distribuição da bebida, além da anunciada degustação dos três tipos encontrados (White, Ruby e Tawny) de seu famoso produto. Uma bela amarração de história, cultura e lazer!  
Percorrendo as margens do Douro. Foto: Anita Di Marco, 2018.

Na volta, cruzamos a ponte pela plataforma inferior e, de novo na Ribeira do Porto, perto da Igreja de São Francisco, tomamos o ônibus (500), rumo a Matozinhos, trafegando ao longo do Douro até sua foz e, depois, junto ao Atlântico. Já em Matosinhos, avistamos ao longe o Terminal de Cruzeiros de Leixões, projeto do arquiteto Luis Pedro Silva. Chegamos a descer do ônibus, mas as visitas não eram mais possíveis.  Também não era mais possível visitar a Casa da Arquitetura. Pena! Terminamos o dia em um agradável restaurante, comendo peixe grelhado e vinho. Lá mesmo, pegamos o metrô de volta para a estação Carolina Michaelis, perto do nosso hotel. 
Terminal de Cruzeiros, Matosinhos. Ver aqui. Foto: Anita Di Marco, 2018.

No sábado cedo, seguimos para o distrito de Braga, na região do Minho, em direção a Guimarães, uma das mais bonitas cidades medievais que conheci. Dubrovnik, na antiga Iugoslávia e hoje na Croácia, ainda está no topo da lista, mas Guimarães segue perto.... 

Conhecida como o “Berço de Portugal”, a antiga Vimaranes tem mais de mil anos. Passeamos pelo Centro Histórico (tombado como bem único pela UNESCO), visitamos o castelo do século 10, local de nascimento do primeiro rei português. Vimos o Paço dos Duques de Bragança, a capela de São Miguel do Castelo, onde o rei foi batizado, e caminhamos por agradáveis ruelas e praças rodeadas de construções medievais e repletas de mesinhas para um bom café acompanhado dos deliciosos doces portuguesas, uma taça de vinho ou, simplesmente, para apreciar o entorno. 
Castelo de Guimarães: cuidado com o original e com o visitante. 
Foto: Anita Di Marco, 2018

 Guimarães é um lugar encantador e que vale a pena visitar de novo. A cidade também faz parte do caminho de Santiago, como ponto de descanso ou passagem dos peregrinos para a cidade espanhola de Santiago de Compostela, a 215 km de lá. Aliás, para quem quer descansar mesmo, sugiro Guimarães como base e algumas viagens bate e volta pela região – Vila do Conde, Ponte de Lima, Vila Real, Amarante, Pinhão, Barcelos, entre outras. Não pudemos ir, dessa vez, mas fiquei com água na boca e, definitivamente, a rota já está na minha lista para viagens futuras.  
Padrão do Salado, 1340. Guimarães. Foto: Anita Di Marco, 2018.

 De Guimarães seguimos para Braga, a mais antiga cidade de Portugal e a principal do Minho. Fundada pelo imperador romano Augusto em 16. A.C., a então Bracara Augusta, com o tempo tornou-se a capital religiosa do país, passando a ser chamada de “Roma Portuguesa”. Como Guimarães, Braga também é um charmoso centro histórico tombado e cidade universitária. Depois de percorrer e admirar seus arcos, largos, torres, igrejas, praças e cafés, seguimos para o Santuário do Bom Jesus do Monte, ponto alto da visita. A igreja atual, que substituiu a de final do século 15, é obra do arquiteto Carlos Amarante e foi iniciada em 1794. Três lances de escada (Escadarias do Pórtico, dos Cinco Sentidos e das Três Virtudes) cobrem os quase 120 metros de distância entre a parte alta da cidade e o santuário. A escadaria cenográfica de mais de 500 degraus, símbolo da ascensão da humanidade até o divino e com várias capelas representando a Via Sacra, foi implantada em diferentes décadas do século 18. Vale subir e descer a pé ou de bondinho, apreciar o parque, a igreja, a escala, as esculturas, as obras de arte e as vistas. A propósito, inaugurado em março de 1882, o funicular tem projeto do engenheiro suíço Niklaus Riggenbach (1817-1899) e execução a cargo do engenheiro português Raul Mesnier du Ponsard (1848-1914). Du Ponsard foi também responsável por vários outros elevadores e funiculares em Portugal.
Santuário de Bom Jesus do Monte, Braga. Foto: Anita Di Marco, 2018.

 De volta ao Porto, após nosso último jantar na cidade, fomos nos despedir de nosso querido e doce amigo, John D. Stewart, profissional de capacidade ímpar do Historic England, órgão responsável pelo patrimônio histórico inglês. Gentilmente, quando soube que estaríamos no Porto, ele fez questão de juntar-se a nós. Foram dois dias incríveis, enriquecidos com sua presença alegre e seus extensos conhecimentos! 

Ao voltarmos da estação, sentimos um vento mais forte, estranho e úmido, mas não percebemos que ele já dava sinais da tempestade Leslie, com ventos de quase 180 quilômetros por hora e que atingiria em cheio a região central do país naquela madrugada, sobretudo Coimbra e arredores como Figueira da Foz. Era a região para onde iríamos na manhã seguinte. Durante a noite, ventos e a chuva se fizeram mais fortes. Pela manhã, assistindo ao telejornal, soubemos dos estragos causados pela tempestade daquela noite. De qualquer forma, tínhamos de seguir viagem e, na segunda-feira cedo, rumamos para Coimbra, com parada em Aveiro
Continua na Parte 2.

Relato dividido em quatro partes:
P1: https://anitadimarco.blogspot.com/2018/11/ecos-urbanos-na-peninsula-iberica-14.html
P2: https://anitadimarco.blogspot.com/2018/11/ecos-urbanos-na-peninsula-iberica-24.html
P3: https://anitadimarco.blogspot.com/2018/11/ecos-urbanos-na-peninsula-iberica-34.html
P4: https://anitadimarco.blogspot.com/2018/11/ecos-urbanos-na-peninsula-iberica-44.html


Quadro de Distâncias (km)


Porto – Braga               
Braga – Guimarães
55
25
Guimarães – Porto
55
Porto – Aveiro
70
Aveiro – Coimbra
62
Coimbra – Tomar
85
Tomar – Batalha
45
Batalha – Alcobaça
23
Alcobaça – Óbidos
40
Óbidos – Lisboa
89















O relato acima também foi publicado no Portal Vitruvius, que postou um número bem maior de fotos. 


DI MARCO, Anita. Na península ibérica. Porto e arredores (Parte 1). Arquiteturismo, São Paulo, ano 12, n. 140.07, Vitruvius, nov. 2018.

DI MARCO, Anita. Na península ibérica. Aveiro, Coimbra e a rota dos mosteiros (Parte 2). Arquiteturismo, São Paulo, ano 12, n. 141.03, Vitruvius, dez. 2019.
DI MARCO, Anita. Na península ibérica. Lisboa e Sintra (Parte 3). Arquiteturismo, São Paulo, ano 12, n. 142.01, Vitruvius, jan. 2019.
DI MARCO, Anita. Na península ibérica. Sevilha (Parte 4). Arquiteturismo, São Paulo, ano 13, n. 144.01, Vitruvius, mar. 2019.


Referências
http://www.monumentos.gov.pt  
https://www.cultuga.com.br
https://www.oportoencanta.com 
https://viajenaviagem.com.br 
https://dicasdeportugal.com.br
https://manualdoturista.com.br/arquitetura-portuguesa/

13 comentários:

  1. Apareceu alguém para organizar a viavem que fizemos. Quase os mesmos lugares

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  2. Arrasou ,amiga. Voce e danada mesmo! Bjs
    Ione

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  3. Que bom que gostaram; eu amei a viagem, nosso roteiro, além de Portugal e Sevilha. Nos comentário,mas não se esqueçam de assinar seu nome no final da mensagem se entraram como anônimos, ou seja, quando vocês não tiverem conta gmail. Obrigada pelos comentários. Apareçam, beijos
    Anita

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  4. Lindo seu relato sobre o Porto e arredores, verdadeira viagem pela terrinha.
    Deu vontade de passar por lá, com certeza.
    Abraços

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    1. Vale a pena, mesmo! Até eu quero voltar, abs
      Anita

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    2. Descrição tão boa, que me senti passeando por lá. Lugares lindis

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    3. Então, pode começar a se preparar... Vale a pena e o roteiro vc já tem..bjs
      Anita

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  5. Até parece uma reportagem! Rico em detalhes, um relato saboroso desta cidade maravilhosa.
    abraços,
    Jose Mario

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  6. Que bom, vale a pena! Obrigada por comentar. Volte sempre, abs
    Anita

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  7. Belo trabalho, Anita! Tanto no texto nuito bem escrito, detalhando as características de cada lugar, quanto as fotos muito bem tiradas, fazendo o leitor viajar por belas paisagens, lugares lindíssimos de se ver e conhecer. Parabéns!

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    1. Olá, Sueli! Que bom que gostou. Acho que é um passeio que vale muito a pena fazer. Pode ir arrumando as malas.... E obrigada por aparecer por aqui. Volte sempre! Beijos
      Anita

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