domingo, 11 de novembro de 2018

Ecos Urbanos | Na Península Ibérica (4/4)

Sevilha
Continuação da Parte 3

Praça de Espanha. Foto: Anita Di Marco
Chegamos à bela capital da Andaluzia cortada pelo rio Guadalquivir no meio da tarde e nos hospedamos no Pateo de la Alameda, um hotel bem agradável, tipicamente espanhol, com pátios, ladrilhos, gradis de ferro fundido, vasos floridos nos peitoris e muitas, muitas plantas. Foi nosso segundo hotel preferido. O primeiro, o de Porto, claro!  Enfim, depois de nos acomodarmos, saímos para comer e passear. 
Vias amplas e compartilhadas. Foto: Renato S. Alves



 Tapas, viños, sangrias e postres, aqui vamos nós.... Tudo muito bom! A cidade é arejada, ampla, arborizada e o que me impressionou, além da quantidade, da qualidade e da limpeza de largos e praças, foi o piso das calçadas e das vias do Centro Histórico – ladrilhos regulares, sem grandes desníveis entre calçadas e ruas, formando um todo harmonioso e onde se percebia um acordo tácito de respeito entre todos os que frequentavam aqueles espaços – dúzias de ciclistas, pedestres, carrinhos de bebês, idosos com ou sem bengalas, turistas distraídos com suas máquinas fotográficas em punho, carros, bondes.... A velocidade? 50 quilômetros por hora, fora do Centro Histórico. No Centro Histórico, nas chamadas áreas pacificadas, a velocidade chegava a 30 km/h e as faixas de pedestres eram totalmente respeitadas. E o que mais nos surpreendeu: ninguém reclamava, ninguém parecia ter pressa, todos transitavam sem estresse, sem buzinas, sem agressividade! Um banho de civilidade! Aliás, também já me referi a isso ao falar de Portugal, o respeito aos pedestres e aos turistas é admirável.
Piso regular, limpeza e preocupação com o verde. Foto: Anita Di Marco
Nosso roteiro sempre procurou aproveitar o máximo do incomparável legado cultural e arquitetônico dos lugares que visitamos. Na nossa primeira tarde em Sevilha, o lugar mais próximo da nossa lista era a Plaza de la Encarnación, revitalizada em 2011. A fantástica obra do arquiteto alemão Jurgen Mayer (1965), o Parasol-Metropol, mais conhecida como as Setas de Sevilha, é uma estrutura de ferro e madeira que se percorre do subsolo (museu arqueológico, lojinha e entrada para o elevador), até o quarto andar, de onde saem as rampas para o último andar, o mirante, a 30 metros do chão. Como Sevilha é plana, lá do alto, tem-se uma vista de 360 graus da cidade....
Setas de Sevilha, praça elevada e intenso uso. Foto: Anita Di Marco
Ao longe, destacavam-se a torre vermelha do Centro Cultural de Sevilha, o mais novo arranha-céu da cidade e cuja construção foi polêmica, a cúpula da grande catedral ao lado da Giralda, a torre-minarete que domina a paisagem local, e a Ponte Alamillo, outra obra de Santiago Calatrava, também para a Exposição Universal de 1992...   

Setas de Sevilha, mirante. Vistas. Foto: Anita Di Marco
À note, tapas e sangria, claro! Na Espanha, as tapas são essenciais na culinária, sobretudo na Andaluzia, mas mais do que isso: são formas de se relacionar. Lá tapear é um ritual social a ser cumprido. E as chamadas terrazas, as mesinhas nas calçadas, inundam a cidade.  Além das tapas, o flamenco é outra marca registrada e tradição em Sevilha, mas também ficamos sem assistir a uma apresentação. Vai para lista, junto com o bairro Triana. A lista da próxima viagem já está ficando bem grande...    
Marco indicativo do Caminho de Santiago. Foto: Anita Di Marco
Entrada para o Real Alcazar de Sevilha. Foto: Anita Di Marco.
Segundo dia em Sevilha – através da minha filhota, descobrimos a existência das fantásticas e democráticas “free walking tours”: passeios a pé pelo Centro Histórico com guias educados, animados e muito bem preparados, com informações corretas e extensas... Os passeios são oferecidos em vários idiomas. Ficamos com o guia em espanhol. Aliás, fica a dica. Os grupos com guias que falam espanhol são bem menores; nosso grupo, por exemplo, tinha sete pessoas, fora Rocio, nossa simpática guia, enquanto o grupo com guia que falava em inglês tinha 22 pessoas. Várias agências oferecem os passeios. Nós escolhemos o grupo da Pancho Tours, identificado com a cor laranja, nas camisetas e no infalível guarda-chuva. Ah, sim! A inscrição deve ser feita pela internet e com antecedência.
 La Giralda, ponto de encontro. Foto: Anita Di Marco
Demos um passeio excelente pela capital da Andaluzia, de quase três horas, vimos e ouvimos falar da história da cidade, de seus povos, dos principais monumentos, arte e estilos. O passeio começava atrás da Catedral, percorria o Centro Histórico, passando pelo Arquivo das Índias, com um riquíssimo acervo de documentos; pela torre do Ouro, construção de 1220, cujo tom dourado, provavelmente, derivava da areia da região...
Arquivo Geral das Índias. Foto: Anita Di Marco

Torre do Ouro. Foto: Anita Di Marco 
Prosseguia pela antiga fábrica de tabaco (que inspirou a ópera Carmem), onde hoje funciona a sede e alguns cursos da Universidade de Sevilha; por belos jardins e parques, como o lindíssimo Parque Maria Luíza e....  
Universidade de Sevilha. Foto: Anita Di Marco
Universidade de Sevilha.Foto: Anita Di Marco
Culminou com a magnífica Praça de Espanha, idealizada pelo arquiteto Aníbal Gonzalez, com direito à estátua na rua lateral que dá acesso à praça. A sede da Expo Ibero-americana de 1929 marcou o final apoteótico de nosso passeio! 
Praça de Espanha. Foto: Anita Di Marco
 Depois de um almoço leve, já no meio da tarde, rumamos para a Igreja Santa Maria de la Sede de Sevilha, cuja construção como mesquita e seu minarete ocorreu entre 1184-1198. Toda construída em tijolos, após a reconquista espanhola, a mesquita foi consagrada como catedral (1248) e, com o correr dos séculos, foram feitos trabalhos e ornamentações em variados estilos: no século 15, a partir de 1434, a parte gótica; no século 16, trabalhos renascentistas, como os corpos superiores da torre que constituem o atual campanário; nos séculos 17 e 18, as obras barrocas; no século 18 e no início do 19, as últimas obras significativas da catedral, como o término dos três maiores pórticos. Declarada Patrimônio Mundial pela UNESCO, em 1987, a catedral abriga os restos mortais de Cristóvão Colombo e de vários reis espanhóis. 
 Catedral e a torre La Giralda. Foto: Anita Di Marco.
Catedral de Sevilha. Detalhe. Foto: Anita Di Marco
Naquele horário, 50 minutos antes do encerramento das visitas, já quase não havia filas. Entramos e percorremos o edifício, boquiabertos com o espaço, a decoração do altar principal, as capelas, as obras de arte, as esculturas, os detalhes, a imponência... e também, convenhamos, em função do curto tempo que nos restava para a visita. Foi rápido, mas proveitoso. No final, os 34 andares da torre-minarete, La Giralda, que chega a 96 metros de altura. De novo, as deslumbrantes vistas de 360 graus a partir do topo e o Pátio das Laranjeiras, lá embaixo, junto à saída.... Mas o mais interessante da subida na torre é que não há escadas e, sim, rampas! Meus joelhos agradeceram muitíssimo! Portanto, não desanimem. Vale a pena subir até lá...
Sinos da Torre-minarete. Foto: Anita Di Marco.
Pátio das Laranjeiras, visto do alto da torre. Foto: Anita Di Marco

Ponte Alamillo, vista da Torre La Giralda.Foto: Anita Di Marco

Dia seguinte, só tínhamos tempo para visitar o Real Alcazar de Sevilha, inacreditável complexo de fortaleza e edifícios de diferentes épocas, jardins e pátios, já que nosso voo de volta estava marcado para aquela noite. Chegamos meia hora antes da abertura dos portões e a fila já era grande, mas ficamos firmes e, depois de uma hora, entramos. 
Muralha em torno do Real Alcazar. Foto: Anita Di Marco

Parte do complexo original dos mouros. Foto: Anita Di Marco
A fortificação de mais de mil anos teve origem em um assentamento romano, a antiga Hispalis romana, depois começou a ser construído na Idade Média, acolheu o califado de Córdoba e, a partir daí, com o desenrolar da história de conquistas e reconquistas, foi remodelado, alterado e expandido incorporando, portanto, arte islâmica, mudéjar (mão de obra muçulmana sob direção cristã), elementos românicos, góticos, renascentistas, maneiristas e barrocos. 
Um dos Pátios do Alcazar, em Sevilha. Foto: Anita Di Marco
Espaços inacreditáveis: pisos, pedras, mármores, cores, azulejos, arcos, fontes baixas, laranjeiras, uma infinidade de plantas, os mais antigos jardins da cidade e em diferentes estilos.... Até hoje os reis espanhóis se hospedam lá, quando em Sevilha. Valeu a espera para ver de perto esse Patrimônio Mundial, desde 1987!
Areia amarelada só encontrada na região: nos jardins, 
na Torre do Ouro e na Plaza de Toros. Foto: Anita Di Marco
  Finalmente, após a visita, comemos nossa última refeição, no El Badulaque, um restaurante muito simpático perto do hotel. Merluza com legumes, salada e sangria para nos despedirmos da Espanha. Sevilha me encantou! Tim-Tim! Depois, era esperar o horário de ir para o aeroporto, agradecer e fazer a longa viagem de volta pela diferença de cinco horas com o Brasil. Primeiro, de Sevilha a Madri. Depois, do imenso aeroporto de Barajas, em Madri, outro edifício admirável projetado pelo arquiteto Richard Rogers, para São Paulo. No dia seguinte, chegamos bem, graças aos lugares premium que a gentil Priscila da Atlantis turismo nos conseguiu, com o corpo um pouco cansado da maratona, o coração muito feliz e a mente cheia de informações a serem processadas. Agora, é tempo de descansar, trabalhar muito e preparar a próxima!   
Nossa última sangria! Gracias e hasta la vista! 

Relato de Ecos Urbanos|Na Península Ibérica  dividido em quatro partes:
P1: https://anitadimarco.blogspot.com/2018/11/ecos-urbanos-na-peninsula-iberica-14.html
P2: https://anitadimarco.blogspot.com/2018/11/ecos-urbanos-na-peninsula-iberica-24.html
P3: https://anitadimarco.blogspot.com/2018/11/ecos-urbanos-na-peninsula-iberica-34.html
P4: https://anitadimarco.blogspot.com/2018/11/ecos-urbanos-na-peninsula-iberica-44.html

Nota:
O relato acima também foi publicado no Portal Vitruvius, que postou um número bem maior de fotos.
DI MARCO, Anita. Na península ibérica. Porto e arredores (Parte 1). Arquiteturismo, São Paulo, ano 12, n. 140.07, Vitruvius, nov. 2018.
DI MARCO, Anita. Na península ibérica. Aveiro, Coimbra e a rota dos mosteiros (Parte 2). Arquiteturismo, São Paulo, ano 12, n. 141.03, Vitruvius, dez. 2019.
DI MARCO, Anita. Na península ibérica. Lisboa e Sintra (Parte 3). Arquiteturismo, São Paulo, ano 12, n. 142.01, Vitruvius, jan. 2019.
DI MARCO, Anita. Na península ibérica. Sevilha ( (Parte 4). Arquiteturismo, São Paulo, ano 13, n. 144.01, Vitruvius, mar. 2019. 


Referências
http://www.monumentos.gov.pt  
https://www.cultuga.com.br

4 comentários:

  1. Ao terminar a leitura, sinto-me como estivesse viajado juntos nesses minutos: lendo seu texto (muito bem escrito), analisando as fotos (cuidadosamente tiradas) e pesquisando no mapa cada cidade pelas quais vocês passaram. Parabéns, viajar enriquece!
    Guilherme

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    1. Obrigada, Guilherme! Viajar enriquece a alma, amplia a mente, nos faz pensar, cria repertório e nos mostra como somos pequenos nesse mundão... Volte sempre! bjs
      Anita

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  2. Olá, Anita!!

    Agora visualizei os mosteiros de Alcobaça, Tomar e Batalha: de tirar o fôlego! Que bom gosto você teve ao fazer esse roteiro! Espero que o Victor veja logo, claro que vai se animar.

    Gostaria de dizer que você pode voltar a Coimbra, porque você amaria o Santa Clara, a velha!! Nossa, tem ruínas da igreja e o cemitério. Esse cemitério amei! Tente ver em imagens, da internet. Os túmulos são tão antigos, que nem se pode pisar na área perto deles. Também um museu com muitas obras. Inclusive, com ossos das freiras, mostrando as articulações, elas sofriam muito com as inundações da antiga igreja - vc mesma cita isso - e tinham dores nos joelhos. Nesse museu tem um documentário, numa sala de cinema, sobre a vida de Santa Izabel.

    Outra coisa que perdemos, embora soubéssemos que existia, foi o poço dos iniciáticos, na subida para o castelo dos mouros e do palácio da Pena. Ficava - o poço - naquele nível intermediário, onde está o palácio que é museu nacional - não me lembro o nome agora!..

    A torre que vc fala, na Universidade de Coimbra, é do relógio apelidado de  "cabra"? O relógio que marcava todos os afazeres e suas horas, desde a Idade Média.

    Fiquei curiosa também com a arquitetura de Siza e da Arquiteta inglesa - olhei fotos na internet.

    Conhecemos Sevilha - mas foi rápido - você aponta vários monumentos que vale a pena visitar!

    Ah, sim. Aquele claustro onde senti plenitude e Êxtase, foi em Santa Clara, a nova. Acho que Santa Cruz não chegamos a ir. MAs vi que é monumental e lindo!!

    Por enquanto, é isso que tenho a dizer!

    Depois, escrevo mais, À medida que for me lembrando.

    Seu texto, nem parece ter 27 páginas, é muito bom de se ler. Está sublime, com o cuidado das informações.

    A linguagem tanto faz chorar, quanto rir. Muito poética e entregue!..

    Parabéns, de novo!!

    Abraços

    Valquíria

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  3. Que delícia de relato, também, Valquíria. Aliás, me basei em muitas informações suas, você sabe. Viajar é tudo de bom. Obrigada por viajar aqui no meu blog, também, beijo grande
    Anita

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