terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

Línguas & Literatura| Sem-Cerimônia

 Outro dia escrevi sobre a reunião que comemorava os 40 anos de minha graduação em Arquitetura e Urbanismo (veja aqui) e mencionava que vários profissionais saíram daquelas famosas rampas da FAU-USP exercendo outras profissões, paralelamente ou não à Arquitetura e seus inúmeros ramos. Mas o mais interessante foi descobrir as coincidências entre mim e outros colegas. Já mencionei a querida Carolina Young e agora falo das coincidências entre mim e outra colega de turma daqueles tempos: ambas formadas na FAU, ambas trabalham (ou trabalharam) com patrimônio histórico, fizeram outras faculdades (ela, Psicologia e eu, Letras), fizeram cursos de Tradução e são tradutoras, se interessam a fundo pela história das religiões e ainda compartilham o prazer e a necessidade da escrita. Um ponto fora da curva entre nós, mas não muito grande, é que ela se dedicou à dança e à ginástica e eu, ao yoga. 
Quando percebi essas coincidências, fiz questão de trocar algumas palavras com ela, já que só nos víamos nos tais encontros de turma. Descobri que havia publicado dois livros – um de crônicas (Meus Queridos Cavalheiros) e o livro de estreia, chamado Sem-Cerimônia. Diário de uma Psicoterapia. Sônia Manski é o nome dela. Claro, já li os dois e vou comentar um pouquinho do segundo. 

Muito bem escrito, com um texto leve, natural, rico e que flui sem tropeços, o livro aborda as sessões de psicanálise de uma narradora fictícia (Vera Anders) na casa de seus ‘trinta e muitos e quarenta e poucos anos’, que questiona sua vida, sua identidade, questões familiares, econômicas, religiosas, sociais e os papeis atribuídos a uma mãe, esposa e profissional nascida na segunda metade do século XX, período de avassaladoras mudanças nos mais diversos campos do conhecimento. Quem nasceu nessa época, sabe muito bem do que estou falando.

Através da psicoterapia, a personagem quer “voltar ao pretérito para fazê-lo perfeito” e o fator que desencadeia não só as sessões, mas também os desejos, reflexões e medos da narradora é a proximidade do 13º aniversário do filho e, portanto, da cerimônia que marca a apresentação do garoto ao seu grupo religioso e social: o bar-mitzvah (filho da lei ou do mandamento, em hebraico). Trata-se da transição mais importante na vida de um judeu, um sinal de maturidade religiosa e como todo ritual, reveste-se de importância singular para o grupo. Quem não está familiarizado com a religião judaica aprende o significado de alguns termos e situações específicas, sempre de forma clara e didática.
A clareza do texto também está presente na projeto gráfico, na diagramação e na mudança de tamanhos e tipos de fontes. 

Enquanto “rascunha o passado para ser passado a limpo”, a narradora busca fazer para si mesmo um outro futuro e a autora enriquece a obra com referências culturais literárias e musicais. Autores, atores, críticos, compositores e músicos comparecem em seu texto, dando mostras do amplo repertório de cultura, leitura e reflexão de Sônia Manski. E aqui, outra feliz coincidência entre nós, sobretudo na preferência por Chico Buarque, um dos seus (e meus também) autores e compositores mais citados. 

Sempre considerei a escrita como excelente recurso para alguém ouvir a si próprio, refletir, elaborar e superar. Aparentemente, a analista também compartilhava da mesma ideia, pois incentivou a autora a escrever. Da mesma lavra, Sônia Manski vai colocando no papel suas impressões, desnudando as sessões, as dúvidas e desafios da personagem ao entrelaçar questionamento, autorreflexão e descoberta. Tudo com leveza, abertura de alma e graça. Ponto para Sônia. Que venham outros!
Sônia Manski (de preto) e Anita Di Marco, no encontro que comemorava os 40 anos de formatura na FAU-USP.

Sem-Cerimônia. Diário de uma psicoterapia.

Sônia Manski

São Paulo: Editora Ágora, 2002. 

4 comentários:

  1. Que delícia ver vocês duas juntas nessa foto, tão felizes, brindando encontros especiais... Gostei muito de seus comentários, Anita! Você escreve muito bem e, como já disse antes, é muito generosa e fluida com as palavras. Gostoso de ler... Como terapeuta que também sou, fiquei bem curiosa sobre o livro da Sonia, querida!! Vou providenciar em breve. Beijos para vocês <3 <3

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  2. Oi Carolina, obrigada pela visita, minha querida e recém-encontrada amiga. Você é sempre-bem-vinda...
    Gentileza sua, escrevo bem quando assunto é bom!!! Tenho certeza de que Sônia vai adorar saber que vc quer ler o livro. E, em tempo, ando pensando muuuuuito (mesmo) em ir a Floripa, cada vez que leio seus posts... <3!!!bjs
    Anita

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    1. Será um prazer encontrar-me com vc aqui na ilha! Quem sabe vc vem e participa de algum evento comigo... Já faz o test-drive completo! hahahahah... Vai ter "Bento Alimento na Montanha" em breve, vc viu? Um retiro especial... Vou mandar o flyer inbox pra vc! beijosss

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    2. Combinadíssimo, gostaria muito...vamos ver. beijos
      Anita

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